São Paulo, quinta-feira, 15 de setembro de 1994
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O Banco do Brasil e os desafios do real

JOSÉ SERRA

É indispensável que o BB aprimore ainda mais o atendimento ao público
A revista "Conjuntura Econômica" de junho publicou um estudo da Fundação Getúlio Vargas sobre os cem maiores bancos em funcionamento no país. Com base nos dados contábeis do exercício de 1993, as informações levantadas mostram que o Banco do Brasil é a maior instituição financeira do país, com um ativo total de R$ 71,2 bilhões e um patrimônio líquido de R$ 6,5 bilhões.
As informações situam o BB entre as dez instituições financeiras que apresentam melhores coeficientes econômicos, como lucro por funcionário, depósitos por funcionário e, mesmo, despesa de pessoal por funcionário. São indicadores que contrariam a idéia corrente de que o BB carrega uma estrutura funcional inchada.
É verdade que o desempenho do Banco do Brasil é menos satisfatório quando se toma a relação lucro líquido/patrimônio líquido como medida. Leve-se em conta, porém, que existem outras instituições financeiras privadas, nacionais e internacionais, com índices de rentabilidade semelhantes ou inferiores aos obtidos pelo BB. Além disso, fatores específicos e razoáveis explicam esse desempenho.
O Banco do Brasil, como se sabe, atua precipuamente no financiamento às atividades produtivas e, desde sua criação em 1808, a trajetória do banco se confunde com a história econômica do país. Hoje, o BB é responsável por 75% do crédito rural e pela maior parcela dos recurso destinados às empresas de pequeno porte. É também –e há muito tempo– o principal agente de apoio às exportações brasileiras.
A superinflação brasileira dos últimos anos induziu a que as instituições financeiras relegassem a um plano secundário o financiamento do setor produtivo, voltando-se para os ganhos elevados da chamada "ciranda financeira".
O "floating" dos depósitos à vista, não-remunerados, ou mesmo dos recursos oficiais, garantia uma fonte fácil e barata para aplicações financeiras altamente lucrativas.
É justo reconhecer, contudo, que o Banco do Brasil não se beneficiou desses ganhos na mesma proporção das outras instituições financeiras privadas, sendo esta uma das causas de seus índices inferiores de rentabilidade.
Com o Plano Real, os tempos de ganhos fáceis do setor financeiro se aproximem do fim. O Banco do Brasil poderá vir até a ser favorecido pela normalização dos negócios bancários, mas terá de procurar, como as demais instituições financeiras, ajustar-se a melhores condições de eficiência e competição numa economia estabilizada.
A vocação agrícola e de apoio à pequena empresa, que caracteriza o Banco do Brasil, será um de seus suportes. Mais de 80% das 4.862 agências do banco funcionam fora das áreas metropolitanas, sendo que 60% se localizam em cidades de menos de 50 mil habitantes.
Em 539 municípios brasileiros –cujas economias ainda são pouco desenvolvidas– somente o BB mantém agência, garantindo a circulação da moeda e o financiamento às atividades produtivas. Tal rede de agências, aliás, foi fundamental na recente troca de moeda, facilitando a introdução do real nos municípios mais longínquos do país.
Na sequência da estabilização, caberá ao BB um papel ainda mais destacado na oferta de crédito à modernização e expansão da agricultura, no fomento às atividades exportadoras e no apoio às pequenas e médias empresas.
Não se pode esquecer as transformações substanciais por que passou a agricultura nos últimos 20 anos: hoje, ao lado de um segmento ainda atrasado, opera e cresce um segmento empresarial, moderno e eficiente, mas que ainda não pode prescindir de crédito abundante e acessível, a taxas de juros compatíveis com a rentabilidade do setor.
Para dar conta desses novos desafios, é imprescindível que o Banco do Brasil se torne um agente mais ativo no exterior, tanto na colocação de papéis, quanto na captação de capitais de risco para investimentos, ocupando os espaços abertos pelo acordo da dívida externa, que proporcionou a retomada das operações com a comunidade financeira internacional.
Para isso o BB, hoje, já atua nas 44 principais praças financeiras do mundo, apoiando o comércio exterior do país e o fluxo de brasileiros.
No plano interno, é importante que o Banco do Brasil diversifique ainda mais seus serviços, atuando, por exemplo, nas áreas de seguros e da previdência complementar. Como é sabido, as diversas propostas de reforma da Previdência Social passam pela implantação de um sistema de previdência complementar.
A atuação do Banco do Brasil nessas áreas permitirá o incremento e disseminação desses serviços pelo interior do país, o aumento da competição no setor e a captação e deslocamento de uma massa razóavel de recursos para financiar os investimentos produtivos.
Em nosso entendimento, que é compartilhado pelo senador Fernando Henrique Cardoso, é indispensável também que o Banco do Brasil aprimore, ainda mais, o atendimento ao público, oferecendo novos produtos e recorrendo a métodos de gestão modernos, de forma a se manter como o principal agente financeiro do governo.
Com isso, terá condições de preservar seu legado histórico e desempenhar novas e ainda mais importantes funções na fase aberta com o real e a estabilização progressiva de nossa economia.
P.S. – Temos recebido muitas indagações sobre a previdência complementar dos funcionários do Banco do Brasil. Mesmo levando em conta que o BB é e continuará sendo uma instituição oficial, entendemos que é necessário preservar um mínimo de liberdade nas aplicações da previdência complementar de seus funcionários, com vistas a garantir-lhe a capacidade futura de atender seus compromissos e evitando que se repita com ela a história da previdência pública. Isto, naturalmente, não é contraditório com a influência governamental na orientação dos investimentos desse sistema na área produtiva, de acordo com prioridades nacionais de desenvolvimento.

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