São Paulo, domingo, 18 de setembro de 1994
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Hermano expõe 'Esculturas para Vestir'

CARLOS UCHÔA FAGUNDES JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA

O artista plástico Luiz Hermano expõe no MAM (Museu de Arte Moderna) de São Paulo, até o próximo domingo, suas "Esculturas Para Vestir". São obras feitas em estreito contato com o corpo, pensando em seu movimento, numa dança sugerida pelos próprios materiais orgânicos de que são feitas.
A convite de Hermano, o Bob Wolfenson fez estudos fotográficos das esculturas, que foram entremeados à mostra, trazendo toda a dimensão viva das obras.
Luiz Hermano, nascido no Ceará, tem sua base em São Paulo desde 1979. Mas sua curiosidade de artista o arrastou a muitos outros endereços temporários, morando em Berlim, Nova York, Paris e Londres. Sua produção rica e obsessiva já o levou ao melhor circuito brasileiro, com três participações em Bienais paulistas, além de esboçar com firmeza uma presença internacional.
Sua obra, muito prolífica e lúdica, tem mantido uma origem constante, que se pode ver desde as linhas sinuosas das primeiras gravuras. Nelas, miríades de personagens mitológicos afloravam da desenvoltura de seu traço. Depois, essas linhas, que pareciam surgir da rotação em torno de um eixo central, começaram a conformar volumes roliços feitos de hastes de ferro. Desses trabalhos, expostos na Bienal de 1991, surgem as esculturas de agora, abandonando a rigidez do ferro e adotando cipós dançantes como matéria-prima.
Às vezes, a dança da linha não vem do cipó, mas do desenho feito no espaço pelas ondulações do arame; então Hermano junta uma constelação de guisos, dando o tom multissensorial da obra: é "Galáxia Para Xamãs". O som dos guisos em certas culturas tem a função de despertar uma alegria espiritual. Aqui, multiplica os sentidos da fruição, mesmo pensando na obra exposta fora do corpo, como iminência de som e movimento, expansão potencial do espaço.
Ligadas a uma poética da experiência imediata do corpo, as obras em geral divisam a polaridade masculino-feminino, gravada nas formas resultantes mais recessivas, voltadas para dentro, ou escancaradas, fálicas. Sem estereótipos rasgados, a mostra fala de sensualidades diferentes, marcadas por experiências específicas.
O ritmo do fazer, brincalhão, mas compassado, faz descobrir a dança que rearticula o espaço, juntando num mesmo compasso a inclinação orgânica do corpo e da matéria-prima. O resultado final não é um experimento sensorial, ou um produto que quer abandonar o redil da arte, mas obras plásticas coerentes, discutindo interações entre linhas, volumes e planos, tramados numa retícula tridimensional.
Aqui talvez esteja a diferença com os universos de Lygia Clark e Oiticica. Neles, a experiência do corpo leva ao objeto, que não mais, necessariamente, precisa ser de arte. Em Hermano, a operação é contrária: o movimento da obra, da matéria e do fazer é que leva ao corpo como possibilidade simultânea, mas não excludente. As obras, ao fim, não precisam do corpo para existirem. A arte permanece arte e a vida, vida; não se engolem.
Exposição: Esculturas Para Vestir, de Luiz Hermano, e ensaio fotográfico de Bob Wolfenson
Onde: MAM (parque do Ibirapuera, portão 3, zona sul de São Paulo)
Quando: até 25 de setembro

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