São Paulo, segunda-feira, 19 de setembro de 1994 |
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Apesar de ameaça, freira brasileira quer voltar
SÉRGIO TEIXEIRA JR.
Ela já tentou voltar uma vez ao país quando estava nos campos de refugiados de Guantánamo (Cuba), mas o militares haitianos disseram que sua vida estaria em risco. Seu embarque foi impedido por autoridades norte-americanas. "Não tenho medo, mas decidi não me entregar à morte de graça", disse ela à Folha. Santina, 53, ligada à Congregação das Irmãs do Imaculado Coração de Maria, trabalhou sete anos junto a camponeses da cidade portuária de Jeremie, no sul do Haiti. Ainda confundindo um pouco os idiomas –respondeu a algumas perguntas com "oui" (sim, em francês e crioulo, as línguas do Haiti) em vez de sim–, Santina falou à Folha. A seguir, os principais trechos da entrevista. Folha - O que mudou no Haiti depois do golpe de Estado? Santina Perin - Durante o governo Aristide, o povo continuava pobre, mas dizia: "Vamos reconstruir o país". Após o golpe, as coisas pioraram a cada dia por causa do embargo. Era para forçar a saída dos militares. Mas é um embargo de peneira: os grandes recebem coisas por baixo, inclusive armas e dinheiro. Folha - A sra. concorda com invasão dos EUA para reconduzir Aristide ao poder? Santina - Não, se os EUA quisessem ajudar teriam feito muito antes. Acho que há interesses lá dentro. Ficaram enrolando o povo durante três anos. Querem entrar, ficar e retirar os frutos. Folha - Por que a sra. decidiu fugir numa balsa? Santina - Em sinal de solidariedade. Ir com eles aonde quer que chegassem. Mas eis que os EUA, quando chegamos a Guantánamo (Cuba), não nos deixaram ficar porque entramos ilegalmente. Folha - E as outras brasileiras que estão em Jeremie? Santina - Éramos quatro. Uma voltou. Duas ficaram lá, estão trabalhando e parece que estão sendo deixadas em paz. Folha - A sra. recebeu alguma tipo de ameaça? Santina - Pelo fato de eu ter saído, não pude voltar. Se eu voltasse minha vida estaria em risco. Os militares telefonaram para o Departamento de Estado norte-americano duas horas antes de partirmos de volta de Guantánamo, dizendo: "Não deixe esses missionários entrarem no Haiti porque vai haver um grande incidente". Folha - A sra. tem medo de voltar ao Haiti? Santina - Não, não tenho medo. Só estou aguardando que esses que estão lá segurando o povo embaixo das botas se retirem. Eles não têm medo, não têm vergonha, consciência ou personalidade. Matam a sangue frio. Eles não nos deixaram voltar. Eu decidi não me entregar à morte de graça. Texto Anterior: Haitiano confia em 'pó mágico' Próximo Texto: Carter chega a acordo provisório com Cedras Índice |
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