São Paulo, quarta-feira, 21 de setembro de 1994
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Leia íntegra de artigo de Lula

Segue, abaixo, íntegra do artigo do presidenciável do PT, Luiz Inácio Lula da Silva

"A instrumentalização da máquina do Estado e a manipulação articulada da informação pela grande imprensa converteram em ilegítimo o processo eleitoral brasileiro. O fato, de extrema gravidade, representa um novo golpe contra a já enfraquecida democracia latino-americana. A estranha criatura eleitoral engendrada pela aliança entre neoliberais e supostos adeptos da social-democracia estende seus tentáculos sobre o governo e procura golpear de maneira desonesta e violenta os partidos comprometidos com a proposta democrática e popular. Em 1989, a difamação e a calúnia caracterizaram a campanha contra o Partido dos Trabalhadores (PT) e seu candidato. Hoje, à divulgação das mentiras soma-se a tentativa de compra de votos, que, em sua versão mais indigna, se manifesta na distribuição seletiva de cestas básicas para parte dos 32 milhões de indigentes que perambulam por nosso país.
Um erro técnico levou aos lares de todo o país, recentemente, as vergonhosas intenções do ministro da Fazenda, Rubens Ricupero, que confessou estar trabalhando pela candidatura oficial. Os fatos demonstram que o ministro disse a verdade ao confessar seus atos. Dados oficiais provam que desde junho o governo distribuiu dinheiro a fundo perdido para municípios escolhidos pela coalizão conservadora. O presidente Itamar Franco, integrado à trama, acaba de ordenar a liberação do financiamento de 300 mil casas populares antes das eleições, sem esperar o visto dos estudos técnicos da Caixa Econômica Federal, que é o banco encarregado de autorizar o empréstimo. Tudo isso está a serviço da candidatura de Fernando Henrique Cardoso, chefe da aliança conservadora.
Além disto, aumentam os casos de repressão policial durante os atos públicos do PT e seus aliados. Documentos apócrifos são distribuídos nas grandes cidades com o objetivo de associar militantes do PT ao tráfico de drogas. Jornais e emissoras de televisão manipulam ou omitem dados para fazer crer que a estabilização econômica é uma vitória absoluta.
Em 1989, fui vítima de ataques pessoais que procuravam manchar minha honra e me indispor com minha família. Hoje a ação coordenada dos setores conservadores da política e das oligarquias donas dos meios de comunicação divulgam informações falsas contra meus principais colaboradores e assessores. Conquistamos o direito de réplica em jornais e revistas, mas o atraso judicial nos impede de expressarmos a verdade a tempo. Enquanto isso, oferecem-se versões em lugar de dados e mentiras, como a de que fecharemos as igrejas protestantes e que confiscaremos o dinheiro dos pequenos poupadores.
O processo eleitoral tem sido digno de uma república de bananas, com pouca discussão sobre os problemas nacionais. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), órgão oficial, revelam que nove milhões de famílias brasileiras vivem na indigência. Há um total de 37 milhões de pessoas que passam fome. Poucos meses atrás, ocorreu um caso exemplar, que chocou os brasileiros. Pessoas que recolhem restos de lixo em Olinda, Estado de Pernambuco, foram surpreendidas comendo restos humanos num depósito de lixo.
Na mesma região nordestina, a mais pobre do país, já se identifica um novo e triste tipo de indivíduo, filho da fome e das péssimas condições de vida. É o homem-abutre, característico das áreas devastadas pela seca, cuja estatura mediana é de 150 centímetros. São magros e vivem pouco. Nas grandes cidades, multiplicam-se os homens-tatus, que vivem em buracos na terra, e os homens que vivem debaixo das pontes e dos viadutos.
Os dados gerais de desemprego da economia brasileira revelam as causas do problema. Uma pesquisa da ONU mostra que a distribuição da renda no Brasil é a 2ª mais desproporcional do mundo, melhor apenas do que a de Botsuana. Dados de 1993... indicavam que os 20% mais ricos da população recebiam 26 vezes mais que os 20% mais pobres. Este ano, a situação se agravou: os 20% mais ricos ganham 32 vezes mais que os 20% mais pobres.
Os últimos ocupantes da Presidência da República pouco fizeram para modificar essa situação. Tampouco o têm feito seus ministros da área econômica, como o hoje candidato Fernando Henrique Cardoso.
Pretendemos assentar pelo menos 800 mil famílias no campo, em lotes de 20 a 30 hectares de fertilidade média. Vamos expropriar apenas as propriedades improdutivas e vamos indenizá-las legalmente. Outra medida urgente será a criação de oito milhões de novos empregos. As pequenas empresas terão prioridade nesse processo.
Trabalharemos por um novo impulso econômico, até recuperar taxas históricas de investimentos e passar de 16% a 25% do Produto Interno Bruto. De 155 milhões de brasileiros, 60 milhões estão do mercado de consumo. A integração destes setores deve gerar uma nova onda de desenvolvimento econômico, circunstância que interessará também às empresas estrangeiras, para investirem a médio e longo prazo.
O reordenamento da economia nos permitirá rever as prioridades orçamentárias para canalizar novos recursos para a saúde e a educação.
Há cinco anos venho viajando com técnicos, cientistas, militantes e parlamentares por nosso imenso território nacional para diagnosticar a crise brasileira com lupa. Nosso programa de governo, resultado desse estudo permanente da realidade, não é uma carta de intenções, e sim uma proposta política e científica para superar os problemas e um chamado à esperança."

Tradução CLARA ALAIN

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