São Paulo, domingo, 25 de setembro de 1994
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Cientistas investigam Aids em fetos

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Só nos últimos anos tem crescido o interesse dos especialistas pelo estudo dos mecanismos de transmissão do vírus HIV, da Aids, da gestante portadora para o feto. Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), em 1990 cerca de 1 milhão de crianças adquiriu a doença em todo o mundo, por esse meio.
Os índices de transmissão variam de uma região a outra sem que se saiba por quê. Mas nem todos os filhos de mulheres portadoras de HIV contraem a doença. Nos EUA a proporção das que escapam é de 70% a 85%. O porquê dessa desigualdade é um dos problemas em estudo, sendo muitas as hipóteses explicativas, nenhuma das quais satisfatória.
Tem-se pesquisado a maneira pela qual se dá a infecção do feito pelo vírus materno. Explicação viável é a de Michael Lairmore, da Universidade Estadual de Ohio. Para ele a chave do problema está nos trofoblastos, células que forram a placenta fetal formando barreira que se opõe à passagem de substâncias nocivas, inclusive vírus. Essas células não possuem o receptor CD4 que permite sua entrada na célula. Sendo assim, dizem alguns, todos os bebês deveriam escapar à infecção, mas Lairmore argumenta que alguns trofoblastos podem apresentar lesões por onde o vírus passaria.
Abaixo da camada trofoblástica ficam as células de Hofbauer, que são macrófagos, elementos do sistema imune encarregados de retirar de circulação as substâncias residuais e estranhas. As células de Hofbauer possuem receptores CD4 e podem, pois, ser penetradas pelo HIV, que se multiplica em seu interior. Não se sabe como conciliar as duas situações, mas sabe-se que o HIV pode associar-se aos anticorpos maternos e, assim disfarçados, invadir as células.
Junte-se a essas informações a de que antes da formação da placenta o vírus materno fica em contato direto com o embrião e pode infectá-lo precocemente.
Ignora-se por que a maioria dos fetos escapa à infecção nesse momento. Pode-se, pois, afirmar que ainda não se sabe como o vírus passa da mãe para o feto. Sabe-se por outro lado que a presença do vírus no sangue materno sofre grandes oscilações, podendo até desaparecer em certos momentos.
Os anticorpos maternos são de vários tipos, alguns dos quais sem ação sobre o vírus. Mas outros podem desempenhar dupla ação defensiva, atuando ao mesmo tempo contra o vírus no feto e na mãe, reduzindo neste último caso a quantidade de vírus capaz de infectar o feto. Drogas como o AZT, quando aplicadas na gestante, podem baixar a capacidade de replicação do vírus e assim proteger o feto.
Que fazer para diminuir os riscos de transmissão ou agravamento da infecção? Em primeiro lugar, as mulheres, quando já são mães, devem evitar alimentar o filho ao seio, porque o vírus passa pelo leite. Possivelmente será útil o uso de AZT e drogas semelhantes que detêm a replicação do vírus, embora ainda não se conheçam os efeitos eventualmente deletérios da droga a longo prazo.
Alguns fetos ingerem sangue e outros materiais contaminados pelo HIV no momento do parto, caso em que nada se pode fazer para evitar.
Quando se dispuser de vacina eficaz contra o HIV será possível tentar esse meio quando da concepção ou antes dela.
Também é possível tentar a injeção de anticorpos neutralizantes adequadamente escolhidos, quando a transmissão estiver relacionada com a quantidade desses anticorpos na mãe.

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