São Paulo, segunda-feira, 2 de janeiro de 1995
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FHC assume governo e convoca mutirão contra miséria e fome

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

Antes de vestir a faixa de presidente da República, Fernando Henrique Cardoso voltou a vestir a roupa do sociólogo incomodado com a dívida social e transformou seu discurso de posse na mais enfática definição de prioridade para o tema.
Depois de afirmar que "falta a justiça social", o presidente emendou: "É este o grande desafio do Brasil neste final de século. Será este o objetivo número um do meu governo".
FHC chegou até a abandonar o tom conciliador próprio de sua atuação política para dizer: "Se for preciso acabar com privilégios de poucos para fazer justiça à imensa maioria dos brasileiros, que ninguém duvide: estarei do lado da maioria".
Foi a segunda das três únicas vezes que seu discurso foi aplaudido pelo plenário não totalmente ocupado da Câmara dos Deputados. Antes, os aplausos foram para a menção a Itamar Franco, que deixava o cargo.
Depois, de novo, para o tema social, quando FHC convocou o país para "um grande mutirão nacional, unindo o governo e a sociedade, para varrer do mapa do Brasil a fome e a miséria".
Fernando Henrique tornou-se o 38º presidente da história republicana exatamente às 16h41 de ontem, quando o presidente do Senado, Humberto Lucena (PMDB-PB) declarou empossados o presidente e seu vice, Marco Antônio de Oliveira Maciel.
Lucena teve seu mandato de senador reeleito cassado pelo TSE por uso irregular da gráfica do Senado, mas a punição, da qual Lucena recorreu, não o impediu de presidir a sessão de exatos 40 minutos com a qual o Brasil mudou de presidente.
Depois, no parlatório do Palácio do Planalto, coberto por um plástico ainda marcado pelas gotas da chuva que caiu antes da cerimônia, FHC recebeu de Itamar a faixa e um prolongado abraço.
O presidente e seu antecessor deram-se as mãos e ergueram os braços, enquanto os fotógrafos, postados abaixo, tentavam comandar a cerimônia aos gritos, pedindo a repetição das poses.
Passava um pouco das 18h e os acordes de "O Guarani" anunciavam o fim de uma festa marcada pelo contraste entre a euforia dos novos governantes e a relativa apatia do público externo, só quebrada quando começou o show musical.
Contraste que ficou mais nítido quando FHC chegou ao alto da rampa e foi recebido por Itamar. Houve muito mais aplausos dentro do que fora do Palácio.
A euforia já amanheceu em Brasília, entre os amigos do presidente que passaram o réveillon na capital ou entre os que chegavam pela manhã, carregando previsões eufóricas.
Como o deputado federal Maurílio Ferreira Lima (PSDB-PE), derrotado na tentativa de ser senador, que dizia: "Vão ser anos de um extraordinário progresso".
Ou como a ministra da Indústria e Comércio, Dorothea Werneck, que, sorrindo muito como é seu hábito, dizia no Congresso: "O astral está altíssimo".
Para o astral alto contribui a virtual ausência de oposição. Pela esquerda, José Genoíno (PT-SP) dava por sepultada a existência dos "contras", os adversários da revisão constitucional, e pregava uma "oposição lúcida".
Pela direita, o prefeito paulistano Paulo Maluf (PPR) perguntava: "Oposição para que, se eu assinaria em baixo o discurso de Fernando Henrique no Senado e ele, se o fizesse há quatro anos, seria expulso do partido?".
Feitas as contas, a única nota de cautela, entre os novos governistas, foi posta pelo próprio presidente, no discurso de posse.
"Sem que o Congresso aprove as mudanças na Constituição e nas leis (...) e sem que a opinião pública se mobilize, as boas intenções morrem nos discursos", avisou FHC.

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