São Paulo, quarta-feira, 11 de janeiro de 1995
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Editoras descobrem ensaísmo brasileiro

DANIEL PIZA
DA REPORTAGEM LOCAL

Este ano os intelectuais brasileiros não aportam só no poder: desembarcam também em todas as livrarias do país. Pense em um intelectual pátrio importante e, salvo raras exceções, ele estará publicando um livro de ensaios em 95.
A lista é extensa e tem títulos ambiciosos (veja nesta página os lançamentos confirmados). O exemplo número um é uma coleção –uma "Brasiliana"– com grandes textos de autores brasileiros que será editada pelo crítico Antonio Candido (nome, data e sequência ainda estão indefinidos).
Medalhões de todas as humanidades comparecem à lista –do próprio Candido, de quem sai "Apontamentos de Viagem", ao filósofo (e amigo íntimo do presidente) José Arthur Giannotti, que lança livro sobre o pensador austríaco Ludwig Wittgenstein.
Por falar em FHC, sua mulher, a antropóloga Ruth Cardoso, também lança livro em 1995: "Bibliografia sobre a Juventude", resultado de suas pesquisas sobre os motins estudantis dos anos 60.
Também estão entre os famosos os críticos literários Roberto Schwarz (com mais um livro sobre Machado de Assis), Davi Arrigucci Jr. (que participa da coletânea "O Cinema no Século" e tem republicado seu "O Escorpião Encalacrado"), Haroldo de Campos (com uma coletânea de ensaios que ultrapassa 500 páginas) e José Paulo Paes (com "Transleituras").
Na filosofia, além de Giannotti, Marilena Chauí (o segundo volume de sua "História da Filosofia") e Paulo César de Souza (sobre os pensadores alemães que traduziu) são alguns dos autores.
Paulo Arantes, Otília Arantes e Renato Janine Ribeiro também estão trabalhando em livros novos, mas os lançamentos não estão totalmente certos para 1995.
Significativamente, diversos traços comuns podem ser destacados na lista dos confirmados.
Economia, por exemplo. O assunto deixa os livros técnicos e se torna amplo e influente nos volumes que os ex-ministros Roberto Campos, Rubens Ricupero e Celso Lafer e o colunista da Folha Eduardo Gianetti da Fonseca estão terminando de preparar.
Na psicanálise, acontece um fenômeno curioso: quase todos os livros previstos abordam a interface entre psicanálise e cultura.
Entre os autores não faltam nomes conhecidos como Renato Mezan, Leda Tenório Motta, Luiz Alfredo Garcia-Roza, Felipe Willemart e Maria Rita Kehl.
Outros cruzamentos de disciplinas estão à vista em livros como "Oswaldo Aranha", com prefácio do historiador Francisco Iglésias, que reúne o economista Mário Henrique Simonsen, o embaixador João Hermes da Fonseca e a socióloga Aspásia Camargo.
Textos de intelectuais mortos, como os escritores Euclides da Cunha e Carlos Drummond de Andrade (este terá a obra completa publicada pela Nova Aguilar) e os críticos Brito Broca e Anatol Rosenfeld (leia texto nesta página), também recebem edição em breve.
E se engana quem acha que na lista só há os intelectuais-medalhões que vêm publicando livros nos últimos anos. Vários intelectuais jovens ou menos conhecidos, mas de comprovada competência, estréiam em livro em 1995.
O crítico literário Fábio de Souza Andrade (sobre o poeta Jorge de Lima), a tradutora Irlemar Chiampi (sobre barroco e modernidade na literatura latino-americana) e o psicanalista e filólogo Luis Alberto Hanns (com um dicionário comparando os termos alemães usados por Freud com seus correspondentes em português), por exemplo, produzem livros de que o leitor pode esperar consistência.
Há também a biografia de Clarice Lispector, que a professora Nádia Gotlib está prestes a concluir.
Ao todo, são mais de 50 livros a que se deve dar atenção. Pode ser que poucos ou mesmo nenhum deles venham a ser marcos da não-ficção brasileira, dignos de uma "Brasiliana" futura.
Mas a quantia, inédita, parece indicar que o intelectual brasileiro está tomando consciência do lema das academias dos EUA: "Publish or perish" (publique ou pereça).
E ninguém, claro, quer perecer em tempos de alta intelectual. Ao que parece, de livros se pode fazer agora, senão um país, ao menos uma carreira.

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