São Paulo, quarta-feira, 11 de janeiro de 1995
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Economia social de mercado

ANTONIO DELFIM NETTO

O movimento internacional na direção da economia social de mercado reflete o fato de que o grande ativismo governamental, que atingiu o seu paroxismo no modelo soviético, é ineficiente. Ele é produto, também, da compreensão de que, frequentemente, as "falhas" do governo são tão ou mais graves do que as "falhas" do mercado.
A esclerose européia produzida por 25 anos de política social-democrática está cada vez mais visível. O maior testemunho é dado por 38 milhões de desempregados na Europa Ocidental. Descobriu-se que o ativismo econômico produzia cada vez maior e mais difusa intervenção na vida privada das pessoas e que no meio da "liberdade" poderia esconder-se o "grande irmão".
Trata-se de um movimento que objetiva despolitizar o exercício da política econômica, retirando das mãos dos burocratas e dos governantes eleitos um grande número de graus de liberdade.
Liberalizar, desregulamentar, privatizar e estimular a competição com leis inteligentes cortam o poder do Estado.
Mas juntamente com esse movimento, resgata-se a idéia de que é preciso criar uma "rede de proteção" (livre da influência político-burocrática) para os menos favorecidos, para todos aqueles cuja igualdade de competição não pode ser assegurada. E que o papel do Estado na promoção competição, da educação e da saúde é insubstituível.
Está comprovado que a maioria dos serviços devolvidos pelo Estado em troca dos impostos se destinam à classe média. O "Welfare State" cuidou muito mal do realmente necessitado. E quando cuidou foi com programas assistenciais que interferiam na preferência das pessoas. É por isso que ganhou espaço o programa de renda mínima, que é a quinta-essência da liberdade individual: o chefe da família (absolutamente racional) toma as decisões de consumo pelos seus membros. É preciso muita fé para aceitar essa glória do individualismo!
A disciplina fiscal se insere nesse programa pelo reconhecimento de que, frequentemente, é a monetização do déficit fiscal que leva à inflação. E que a inflação é uma tributação disfarçada que recai exatamente sobre os mais pobres. Trata-se de expor à luz do dia "l'illusione finanziaria" de que nos falava já no começo do século,o grande Amilcare Puviani.
É claro que ficam na mão do governo os instrumentos da política econômica (taxa de juros, taxa de câmbio, tarifas alfandegárias, meios de pagamentos, nível de tributação). O que o governo perde é o poder de manipular diretamente os homens para dedicar-se às atividades que só ele pode fazer: exigir o respeito às leis e proporcionar educação e saúde para todos.
Os prejuízos e atrasos produzidos pelo excesso de ativismo e politicagem no setor público não devem, entretanto, levar à divinização do "mercado". Sem regulamentação rígida e sem um Estado forte não há "mercado" que funcione!
Acostumada com o sucesso dos truques retóricos, a velha esquerda (que se crê "nova") tenta chamar a esse movimento de "neoliberalismo", na esperança de que um novo estigma nominal faça o mesmo serviço antigo: um slogan para proteger seus interesses corporativos e sua propensão infinita ao paternalismo.

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