São Paulo, quinta-feira, 12 de janeiro de 1995
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Não adianta dourar a pílula

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Infelizmente sou obrigado, hoje, a provocar pânico em nossos leitores. Todos os laboratórios que produzem os 20 mil remédios vão sofrer devassa. Motivo: a suspeita de que os produtos não tenham boa qualidade. As empresas serão recadastradas para que possam continuar abertas.
A suspeita não poderia vir de fonte mais gabaritada. Professor da Escola Paulista de Medicina, Elizaldo Carlini é um dos maiores estudiosos brasileiros em medicamentos, o que lhe conferiu renome internacional. Por indicação de Adib Jatene, ele ocupa, agora, a Secretaria de Vigilância Sanitária.
Carlini já recebeu informação de bastidores do próprio setor farmacêutico: depois da peneira, laboratórios serão fechados, por falta de condições de funcionamento.
O secretário revela que nem ao menos se sabe com precisão quantos laboratórios existem. Diz ainda que o governo não tem a "menor idéia" da qualidade do medicamento produzido no Brasil. Ou seja, o consumidor está nas mãos dos fabricantes.
Ele conta que já foram feitos testes por faculdades para avaliar a qualidade de alguns remédios. Encontrou-se uma série de irregularidades. É apenas um indício, segundo ele, de desagradáveis surpresas que uma investigação detalhada é capaz de encontrar.
Óbvio que existem laboratórios sérios, resistentes a qualquer devassa. Mas, conhecendo-se a baixa taxa de respeito à cidadania no Brasil, vamos encontrar remédios feitos em estabelecimentos que nada ficariam a dever a um chiqueiro.
PS – Por falar em chiqueiro, o lobby da nicotina está mais ativo do que nunca. Alega que o Ministério da Saúde não poderia baixar a portaria limitando a publicidade; sua estratégia é jogar a questão no Congresso. Talvez tenha até base jurídica. Caso se transfira a decisão ao Legislativo, os políticos sérios deveriam inspirar-se em países da Europa. E tomar uma decisão mais radical do que apenas restringir a publicidade: proibi-la pura e simplesmente. E, aí, vamos ver quem é sensível à saúde do cidadão ou ao poder econômico.

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