São Paulo, sexta-feira, 13 de janeiro de 1995
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Maus frutos

JANIO DE FREITAS

Um governo que se propõe a introduzir a racionalidade sugere, implicitamente, que não será ele próprio, sequer por um momento, exemplo de irracionalidade. A sugestão é enganosa, porém. Se não há cabimento em cobrar medidas inovadoras passadas apenas duas semanas de governo, não deixa de ser espantosa a falta de bom senso demonstrada sem interrupção, e ainda com ares de suposta eficiência moderna.
O presidente Fernando Henrique está sofrendo do pior dos males de quem tem quaisquer funções executivas: reunite aguda. Reuniões sucessivas, amplas, prolixas, são o encanto dos neófitos em comando e dos perplexos ante as tarefas. Os primeiros têm aí o gozo tolo da superioridade. Os perplexos supõem dar a impressão de atividade. Mas em nenhuma área executiva é possível escapar deste axioma, que até os americanos estão aprendendo: quanto mais reunião, menos produção (ou ação).
Horas e horas já foram gastas em reuniões, entre muitas outras, do tal Conselho Político. Para nada. Ou melhor, para que de todo o blablablá saíssem duas idéias tresloucadas. A primeira, um seminário (bem acadêmico, não?) reunindo Fernando Henrique e as três centenas de parlamentares dos supostos partidos governistas. Está claro que não seria seminário, mas um massacre. A idéia não resistiu às primeiras críticas estarrecidas.
Mas da reunião seguinte surgiu a criação de um outro conselho, este de ex-parlamentares que negociem com os atuais as propostas do governo. É um emprego interessante para os que não conseguiram se reeleger, com o pequeno inconveniente de que só vai gerar uma balbúrdia infernal.
Mais relax, sob um aprazível alpendre, a reunião geral do governo também resultou, além dos desejados teipes e fotografias, em dois frutos contra o bom senso. O primeiro, que deve ser a última novidade em matéria de burocratização progressiva, é a criação de câmaras temáticas. Ou seja, representantes de diferentes ministérios reunidos em grupos, para estudo de cada tema do planejamento e decisão governamental. Mas, até que se prove o contrário, cada ministério já é, por definição, uma câmara temática. É só ver o nome de cada um deles. Para os casos excepcionais, existe a velha e simples solução do grupo de trabalho. O resto é irracionalidade de quem anda atrás de aparentar inovação, ainda que resultante só em mais peças no labirinto governamental.
O outro fruto da reunião foi servido pelo próprio Fernando Henrique. É a ordem de que os integrantes do governo não manifestem opiniões e conceitos contrapostos, mas se mostrem sempre homogêneos. Pelo que se tinha entendido até aí, desde os primórdios da campanha eleitoral, nada de importante se decidiria no governo Fernando Henrique senão como consequência do debate, estendido até a sociedade. Agora, na fonte mesma dos assuntos a debater instala-se a concordância a priori, o não-debate. Isto, alguém pode argumentar, é só para as declarações públicas. E não é das declarações públicas que provêm as propostas e contrapropostas entre as quais a sociedade faz suas definições?
Os integrantes de um governo têm que ser homogêneos no cumprimento das decisões, não no escamotear as divergências conceituais e técnicas em questões de importância para a sociedade. Instalado o não-debate, se algum ministro emitir uma asnice, à opinião pública só é oferecida a asnice, não o possível contraponto do bom senso.
O tema da irracionalidade vigente não precisa de câmara específica para ir muito mais longe. Volta-se a ele, portanto.
Agora sim
Foi uma grande operação, sem dúvida: 4.200 pára-quedistas, infantes, fuzileiros, do Exército, da Marinha, da Aeronáutica, e mais policiais militares, policiais civis, guarda civil, polícia feminina. Foi completa a ofensiva terrestre e aérea às 13 favelas do morro carioca do Alemão.
A apreensão de drogas não foi entusiasmante, equivalente aos negócios de um ponto de venda em uma noite: 300 trouxinhas de maconha, 1.300 doses de cocaína. Espera-se, no entanto, que a apreensão de armas –o principal objetivo das operações militares– tenha satisfeito aos comandos: 5 revólveres, 3 pistolas, 4 fuzis e 2 espingardas. Em média, uma arma por favela.
A Aeronáutica perdeu um helicóptero, o que talvez seja razoável em vista do arsenal recolhido.

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