São Paulo, sábado, 14 de janeiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A Amazônia esquecida

JOSÉ CARLOS CASTRO

Com pouco mais de 5 milhões de eleitores –quatro vezes menos do que São Paulo– e com população que se aproxima dos 16 milhões de habitantes, a Amazônia Legal, mais da metade do território brasileiro, ficou esquecida na composição do ministério.
Desobedecendo a máxima de Ricupero, da Amazônia divulga-se o lado negativo: violência rural, ataques aos ianomâmis, apreensão de drogas, emasculação de menores, estupro de índios e sequestro de avião. O lado doce e poético da região desaparece no silêncio misterioso.
Esquecida também dos candidatos. Enéas, do Acre, não dedicou um só programa à região. Quércia só fez planos para as outras. Amin a esqueceu por completo. Lula, que foi bem recebido nas cidades visitadas, passou três programas falando da greve dos metalúrgicos do ABC, enquanto no Pará os professores estavam em greve há mais de um mês, com salário médio inferior 12 vezes aos dos grevistas de São Paulo. Só Fernando Henrique dedicou um minuto à região, ressaltando que é filho de mãe amazonense.
Não é sem razão que, ao ser planejada a Transamazônica, foi logo denominada de "rodovia das onças", pelo ex-presidente Jânio Quadros. Hoje encontra-se em estado de abandono. Quando se ventilou, recentemente, o seu asfaltamento, surgiu a indignação de políticos sulistas.
A maior hidrelétrica genuinamente brasileira, Tucuruí, ainda não foi concluída. Mesmo assim, abastece de energia grande parte do Nordeste, enquanto o Estado do Pará, em apenas 60% dos municípios. A hidrovia Araguaia-Tocantins ficou somente nos planos.
A culpa, em parte, cabe à representação política da região, que trabalha sem unidade e permanece, ao longo dos mandatos, praticamente desconhecida. Como pólo administrativo, Brasília seduz os prefeitos dos mais recônditos municípios a ir pessoalmente cuidar de seus interesses na capital federal. Essa via sacra não mudou ao longo dos anos.
Os ministros escolhidos pelo novo presidente, entre eles, o acreano da Saúde, não conhecem a região amazônica; quando muito visitam-na a passeio ou para meros compromissos protocolares.
Não se desconhece que o ministério não pode atender todos os Estados. E nem o regionalismo deve prevalecer sobre a capacidade e eficiência. Ocorre que a Amazônia, mais da metade do Brasil, não é tratada pela importância geoeconômica, mas pela quantidade reduzida de seus eleitores e habitantes.
Nesse ponto de vista, não há nenhuma diferença dos governos anteriores para o do sociólogo do desenvolvimento, cuja escolha foi mais pelo peso político do Estado e pela proximidade de Brasília.
Resta saber se a Amazônia continuará como o lugar distante e imaginário, que na consciência comum, começa em Pernambuco e termina próximo aos Andes.

Texto Anterior: Confusão à mesa; Os anéis de Gardel
Próximo Texto: 9% das farmácias de SP são clandestinas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.