São Paulo, quarta-feira, 25 de janeiro de 1995
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Fritz Lang inventa o cinema com "M - O Vampiro de Dusseldorf"

CÁSSIO STARLING CARLOS
EDITOR-ADJUNTO DA ILUSTRADA

"M - O Vampiro de Dusseldorf" é o primeiro filme sonoro realizado pelo diretor alemão Fritz Lang, em 1931. Com roteiro de sua então mulher, Thea von Harbou, Lang narra em "M" a caça a um maníaco homicida, interpretado à perfeição por Peter Lorre, com seus olhos esbugalhados e sua voz infantil.
Depois da desaparição da pequena Elsie Beckmann, a polícia dá início a uma devastadora investigação para deter o criminoso. Todo o submundo de foras-da-lei se verá acuado e dará início, por conta própria, à caça ao maníaco, que está atrapalhando o bom andamento de seus negócios escusos.
Desdobrando motivos do filme criminal –já presentes nos dois primeiros "Dr Mabuse"–, Lang parte para a exploração do que veio a ser o núcleo de sua obra posterior: o confronto entre um indivíduo acusado de um crime e uma massa furiosa pronta para executar a justiça.
Às vésperas da ascensão do nazismo, Lang pretendeu dar o significativo título de "Os Assassinos Estão Entre Nós" a esta parábola sobre os mecanismos da justiça, mas foi impedido pelas autoridades. Mas, para além do significado político, o que Lang constrói em "M" é um inventário da vocação moderna do cinema.
Abandonando a mitologia germânica ("Os Nibelungos"), a parábola futurista ("Metropolis", "A Mulher na Lua") e os temas derivados do romantismo ("A Morte Cansada"), Lang reconheceu a necessidade de superar o investimento cênico que caracterizava a fórmula em vigor no cinema alemão dos anos 10 e 20, mais conhecida como expressionismo.
Como um artista experimentando as potencialidades do novo instrumento, Lang elabora soluções dramáticas ousadas, como a disjunção entre som e imagem.
Na sequência da morte de Elsie, a canção que o maníaco assobia acompanha o trajeto do balão largado pela menina. A esta imagem vêm se sobrepor os gritos de Frau Beckmann ("Elsie, Elsie"). O som passa a ser um signo que intensifica dramaticamente uma imagem que já não está mais lá.
Esta natureza disjuntiva dos signos –que caracteriza a modernidade do próprio cinema– se transforma em metáfora narrativa nas mãos de Lang: é um cego (um ser carente da imagem) que descobre o assassino através do seu assobio (do som, portanto).
Mesmo que toda a obra que Lang realizou em seu exílio em Hollywood seja considerada menor por alguns críticos, a grandeza de filmes com "M" justifica sua inclusão no panteão dos inventores da linguagem cinematográfica.

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