São Paulo, segunda-feira, 30 de janeiro de 1995
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Cultura busca novo modelo para salvar-se da extinção

ELVIS CESAR BONASSA
DA REDAÇÃO

Iniciativa privada, municipalização, corte de gastos. A receita preparada pelo secretário estadual da Cultura, Marcos Mendonça (PSDB-SP), para salvar sua pasta não é nova. Neste caso, é a única.
A secretaria foi desmontada: perdeu 70% de seus funcionários, que eram ligados ao Baneser, e ficou com parcos R$ 25 milhões para passar o ano, descontadas as dívidas pendentes.
Mendonça tem agora um mês –prazo para o desligamento final do Baneser– para cozinhar sua solução: convencer prefeitos a assumirem oficinas culturais, transformar orquestras em cooperativas, estimular o surgimento de sociedades amigos de museus.
E, como Assis Chateaubriand, o personagem central de "Chatô", que acaba de ler, convencer empresários a soltar dinheiro para a cultura. Com uma diferença: Chatô estava montado em um império de comunicações, capaz até de vencer as resistências pela chantagem. Mendonça, ao contrário, tem apenas recursos que não chegam ao valor de um quadro exposto no Masp.
É tarefa para um ano, mas o secretário mantém um otimismo inflexível. Garante que não haverá paralisação das atividades ligadas à secretaria e que 30 dias são suficientes. Em entrevista à Folha, na sede da secretaria (ameaçada de despejo por falta de pagamento de aluguel), Mendonça traçou o perfil do que chama um novo modelo.

Folha - O sr. foi convidado para uma secretaria com 2.000 funcionários e R$ 120 milhões. Acabou assumindo pouco mais de 500 funcionários e só R$ 60 milhões, dos quais R$ 35 milhões já comprometidos em dívidas.
Marcos Mendonça - É possível um modelo novo. O anterior estava falido, baseado numa estrutura irregular. Por outro lado, a secretaria não teve nenhuma parceria significativa com a iniciativa privada. Nós queremos trazer a iniciativa privada para participar.
A Orquestra Sinfônica, por exemplo, é financiada só pelo Estado. É possível um patrocínio institucional privado. Isso vale para a Orquestra Jazz Sinfônica, corais e todas as atividades afins.
Para isso, está em fase adiantada a criação de cooperativas. A orquestra cooperativada poderá buscar patrocínios. Mais: as cooperativas serão contratadas pelo Estado para apresentações.
Folha - As leis de incentivo à cultura têm mostrado que o interesse privado fica muito abaixo do esperado. O que a secretaria tem a oferecer para atrair a iniciativa privada?
Mendonça - Estamos montando um balcão de projetos culturais, para orientar produtores culturais e artistas sobre incentivos público e privados. Ao mesmo tempo, isso permitirá uma aproximação. Queremos divulgar os projetos junto a empresários, mostrando as vantagens desse investimento.
Folha - Todas as atividades, como museus e oficinas culturais, serão cooperativadas?
Mendonça - Não. Isso vale para a área de música. Para as oficinas culturais do interior, vamos fazer convênios com prefeituras. A secretaria dá toda a orientação, estabelece a programação, mas o custeio deverá ser bancado pelas prefeituras.
Vamos estabelecer também, tanto no interior quanto na capital, novos horários. A oficina pode funcionar sábado e domingo, que são dias fundamentais, e estabelecer um sistema de folgas na segunda ou na terça. Nos outros dias, as ações poderiam ser desenvolvidas à tarde e à noite. Com isso, caem os custos porque se elimina um turno de trabalho.
Folha - Para a capital, não vale a municipalização?
Mendonça - Em São Paulo, oficinas, e teatros também, têm uma capacidade de gerar recursos que não está sendo utilizada. Da concessão de um bar a uma lojinha que venda material relativo às suas atividades. Além de gerar recursos para suprir alguns gastos, isso vai permitir divulgar o museu.
Folha - Mas quem contrata os funcionários, que hoje são do Baneser?
Mendonça - Eles não serão vinculados ao Estado. Ou serão contratados pelas prefeituras, no caso da municipalização, ou as próprias oficinas culturais e museus fazem isso, através de sociedades de amigos, que também negociarão patrocínios.
Folha - Não há garantias que isso vá gerar recursos a curto prazo.
Mendonça - Vamos realizar cortes de despesa para liberar recursos. Segurança e limpeza são hoje os itens mais caros. A média salarial pelos contratos está em torno de R$ 1.200. Vamos rever esses contratos.
A segurança da Pinacoteca custa R$ 25 mil por mês. Se reduzir para R$ 12,5 mil, economizo R$ 162,5 mil por ano, contando 13º salário. Isso numa unidade, sem contar limpeza. Posso economizar recursos para usar em projetos.
Folha - Por que não foi montado até agora o conselho cultural para operacionalizar a aplicação da lei estadual de incentivo à cultura, aprovada em 94?
Mendonça - Algumas coisas precisam ser alteradas. O decreto que a regulamentou não define nenhum mecanismo, como as guias para o recolhimento ou as normas internas de controle. Além disso, as regras para a escolha do conselho são inaplicáveis, por erro de formulação.
Folha - O Prêmio Estímulo, atrasado desde o ano passado, vai ser pago?
Mendonça - Neste instante, a curto prazo, não há perspectiva, porque não há recursos. Neste ano, vamos ver se haverá recursos para a concessão antes de abrir inscrições para o prêmio.
Folha - Convênio com o Teatro Oficina, assinado no final da última administração, prevê pagamento de custeio e financiamento de parte de uma produção. Será mantido?
Mendonça - Esse convênio sofreu fortes restrições da Procuradoria Geral do Estado. Foi assinado no último dia da administração com todas essas ressalvas. Já determinei que a assessoria jurídica examine o caso para verificar se é possível seu cumprimento.
Folha - No caso do Teatro Ruth Escobar, o Estado alugou o espaço mas não paga desde setembro do ano passado. O aluguel será mantido?
Mendonça - Dificilmente. Vou levar hoje (sexta-feira) ao ministro Francisco Weffort a proposta de que a Fundação Banco do Brasil assuma os custos desse teatro.
Folha - E a idéia de homenagear Tom Jobim no Festival de Inverno para convencer artistas a abrirem mão do cachê e baratear os custos?
Mendonça - (risos) Não é só para tentar baratear os custos. Tom Jobim teve uma visibilidade enorme e uma qualidade enorme. Nós queremos prestar uma homenagem. Se vai gerar economia, é uma outra consequência. Queremos também negociar o festival com uma empresa privada, em sua totalidade.

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