São Paulo, segunda-feira, 9 de outubro de 1995
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La La La Human Steps perde a vivacidade

ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM MONTRÉAL

Quem vibrou com as apresentações do La La La Human Steps, no Carlton Dance Festival em São Paulo, não imaginaria que os espetáculos do aclamado grupo canadense pudessem se transformar em tédio total.
A última produção do grupo, intitulada ``2", que estreou sexta-feira em Montréal, no Festival International de Nouvelle Danse, é uma antítese à obra anterior de seu coreógrafo, Édouard Lock.
Talvez em busca de uma nova fase, Lock aboliu a parafernália tecnológica que envolvia seus espetáculos. O ritmo eletrizante de suas coreografias, ressaltado pelas piruetas acrobáticas da bailarina Louise Lecavalier, foram igualmente eliminados.
Livre de adereços, Lock tenta se deter em elementos essenciais. Só que esta escolha revela sua fragilidade como coreógrafo. É como se os adornos anteriores estivessem encobrindo um grande vazio.
Na apresentação de ``2" em Montréal, havia gente dormindo na platéia. Outros preferiram sair antes do fim.
Indiferente ao espetáculo, Anna Kisselgoff, crítica de dança do jornal ``The New York Times", comentou que simplesmente o La La La não tem nada a dizer.
Fim do La La La? ``2" lança esta dúvida e faz lembrar que, afinal, a formação de Lock tem mais a ver com cinema do que dança.
Clima desolador
Em ``2" Lock recusa músicas pop e, pela primeira vez, utiliza peças barrocas, de autoria de Rameau, Frescobaldi e Forqueray. Como antes, a execução é ao vivo.
Dois cravistas permanecem no palco durante quase duas horas, extremamente longas e sem intervalo. Ambiente e figurinos negros, iluminação monocórdia, contribuem para o clima desolador que envolve também o enredo.
A dualidade entre vida e morte é o tema de ``2". Em filmes projetados em grandes telas verticais, colocadas lado a lado, Louise Lecavalier surge em duas fases: jovem e velha, no leito de morte (com toda a maquiagem capaz de transfigurar seu rosto).
Implacável, sem brechas para qualquer conotação de renascimento ou renovação, as sequências seguintes não deixam o espetáculo decolar.
Fechada em si mesma, a peça vai perdendo o contato com o espectador, que fica à espera de Godot, aquele personagem que nunca aparece.
Desta vez, não sobrou final feliz para Lecavalier, símbolo de vivacidade do grupo. O personagem que ela interpreta sucumbe ao mundo triste que a rodeia, morrendo no fim.
Resta esperar que ``2" seja apenas a expressão de um artista em crise.

Espetáculo: ``2"
Coreógrafo: Édouard Lock
Grupo: La La La Human Steps
Onde: Festival International de Nouvelle Danse de Montréal
Quando: sexta-feira e sábado

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