São Paulo, sábado, 14 de outubro de 1995
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Rotblat ajudou a fazer bomba

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O físico Joseph Rotblat e o movimento Pugwash ganharam o Nobel da Paz no ano que relembra os 50 anos das duas bombas atômicas sobre o Japão. Ele ajudou a construí-las, primeiro na Universidade de Liverpool (Reino Unido), depois em Los Alamos (EUA).
Largou o projeto por discordar de seu uso contra uma população civil. ``Quando eu soube da destruição de Hiroshima, fiquei devastado, relembra agora.
Rotblat percebeu que o apetite militar por armas de destruição maciça não pararia nas bombas-A (de ``atômico"). "No escritório ao lado do meu, Edward Teller e Stan Ulam trabalhavam no projeto Super, a bomba de hidrogênio.
O belicoso Teller, pai da bem mais destrutiva bomba-H, também foi entusiasta do programa ``Guerra nas Estrelas", de defesa contra mísseis balísticos. Um anti-Rotblat, Teller ganhou o sarcástico prêmio Ig-Nobel (trocadilho com ``ignóbil") da Paz, concedido por um grupo ligado ao MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts).
Rotblat tem a paciência dos militantes que se envolvem em causas durante décadas. Paciência e simpatia. Um exemplo aconteceu em sua última visita ao Brasil, no começo do mês no Rio de Janeiro.
O gravador portátil do repórter da Folha teimava em não funcionar. Rotblat ia se encontrar com cientistas na Coppe (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Pacientemente, o físico esperava o repórter terminar sua briga com o gravadorzinho, bem menos sofisticado que uma arma nuclear. ``Tudo bem, o pessoal que fez a bomba atômica não saberia fazer um gravadorzinho desses", brincou. A entrevista fui publicada na Folha no último domingo, dia 8.
Rotblat fará 87 anos no próximo dia 4 de novembro. É o único signatário ainda vivo do famoso manifesto Russell-Einstein, divulgado em 9 de julho de 1955.
O manifesto, criado por inspiração do filósofo Bertrand Russell, foi um dos últimos gestos políticos do cientista mais famoso do século, Albert Einstein. Rotblat, por ter trabalhado no projeto Manhattan de construção da bomba, presidiu a sessão de divulgação.
``A característica de Pugwash é perseguir seus objetivos de um modo pragmático. Pugwash combina idealismo com realismo", diz Rotblat, que se engajou no projeto da bomba por medo que os nazistas também fizessem a sua.
Nasceu em Varsóvia e se educou em universidades polonesas. Era diretor-assistente do Instituto de Física Atômica da Universidade Livre da Polônia em 1939, quando alemães invadiram o país.
Sua paciência com repórteres e seus gravadorezinhos é compreensível. Ele foi pioneiro na divulgação científica da energia nuclear para o público leigo através de um ``Trem do Átomo", que viajou a Europa e o Oriente Médio propagando as aplicações civis e militares da nova forma de energia.

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