São Paulo, segunda-feira, 23 de outubro de 1995
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Com a palavra a imagem

ALEX PERISCINOTO

A discussão vem de longe. Os diretores de arte dizem que uma imagem vale mais que mil palavras. Os redatores defendem que às vezes é necessário mil palavras (ou mais) para explicar uma imagem. Quero voltar a essa discussão. Esse assunto é gostoso de polemizar, esmiuçar, confrontar.
Se estivéssemos só falando de campanhas para rádio, os redatores poderiam até ter razão. Tudo no rádio é feito com palavras, sons. Como diz o meu amigo Fausto Silva, a única coisa que o rádio não faz é aula de mímica.
Porém, quando a discussão parte para a mídia impressa ou televisão, aí a coisa muda -sabemos a força que a imagem tem nesses casos. No entanto, seria interessante que não houvesse predominância de nenhum dos dois lados (direção de arte e redação), que um lado entrasse em sintonia com o outro. É quando a gente vê que dois e dois indiscutivelmente são cinco.
Excelentes exemplos não faltam para provar que é possível chegar a resultados eficientes e criativos.
Um deles é um anúncio americano, que mostra uma foto de uma sala de hospital, cirúrgica, com todos os seus frios e assustadores instrumentos: tubos de oxigênio, bisturis, sondas, telas para leitura de batimentos cardíacos. E, logo abaixo da foto, a seguinte indagação: "Onde você vai passar o seu fim-de-semana?".
A imagem desse anúncio vai muito além da frase "Dirija com cuidado". Uma imagem que alerta e convence. Coisa, por exemplo, que a campanha contra a Aids, aqui no Brasil, está nos devendo.
A recente campanha veiculada na TV tem um toque leve, bem-humorado, capitalizou muito bem o nome, mas tenho minhas dúvidas quanto aos resultados positivos. A campanha, na verdade, está pondo apenas um esparadrapo num problema bem mais grave.
Ainda sobre campanhas de prevenção à Aids e sobre o poder da imagem na propaganda, cito um trabalho supercriativo e eficiente, realizado na Inglaterra. O comercial, utilizando só metade da tela de TV, em cores, mostra uma linda jovem, de seus 17, 18 anos, que é apresentada como sendo "estudante, inteligente, cheia de vida, que já teve muitos namorados..." É quando a outra metade da tela abre e, em branco e preto, aparece uma foto da mesma moça como paciente terminal.
Ela só não se prevenia contra a Aids. Provavelmente não exigia de seus parceiros o uso da camisinha, o que, sempre é bom ressaltar, é o meio mais indicado para se evitar a doença.
Agora, para entrar em exemplos mais alegres e igualmente eficientes, cito o anúncio que ilustra esse artigo. Um anúncio que, além de possuir um humor relevante, conjuga muito bem imagem e texto, embora nele a imagem seja mais expressiva. Se deixássemos apenas o título do anúncio ("Compatibilidade nunca é um problema para um Macintosh Apple"), que interesse esse trabalho despertaria? A imagem da tartaruga sobre o capacete vem reforçar, dizer mais que qualquer palavra escrita.
Está mantida a discussão. São muitos os exemplos que poderiam enriquecer essa polêmica. O espaço é curto, infelizmente. Por mais palavras que eu ponha, histórias que eu conte. O importante é saber que para a criatividade não há limites. Mesmo que alguns achem que tudo que era para ser dito já foi, que tudo já foi mostrado.
Nós ainda não chegamos nem a arranhar 5% do nosso poder criativo. O público pode aguardar que a criação está cada vez mais próxima da linguagem do povo, pronta para oferecer gostosas surpresas gráficas, como essa da tartaruga.
Principalmente quando estiverem com a palavra diretores de arte e redatores com o brilho e os prêmios dos profissionais brasileiros. Profissionais que já estão formando uma nova geração de talentos por aí afora.

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