São Paulo, segunda-feira, 6 de novembro de 1995
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Estudioso critica processo de paz iniciado em 93

ROGÉRIO SIMÕES
DA REDAÇÃO

O linguista norte-americano Noam Chomsky, 66, acredita que um possível Estado palestino independente ainda está longe de se tornar realidade.
Para ele, o processo de paz entre árabes e israelenses apenas reproduz os interesses defendidos por Estados Unidos e Israel.
Um dia depois do assassinato de Yitzhak Rabin, em entrevista à Folha, por telefone, Chomsky disse que a imagem de um Rabin pacifista é resultado de uma propaganda norte-americana.

Folha - Qual foi a sua reação quando o senhor soube da morte de Yitzhak Rabin?
Noam Chomsky - Um assassinato político, ou de qualquer pessoa, é um acontecimento trágico. Mas ele não foi o único a ser morto recentemente. Dias atrás, o líder da Jihad Islâmica foi assassinado pela inteligência israelense.
Folha - O crime, neste momento do processo de paz, foi uma surpresa?
Chomsky - É sempre uma surpresa quando um líder político conhecido é assassinado, mas os ataques dos grupos de extrema direita contra ele tinham sido extraordinários nos últimos meses. O fato de que alguém pudesse tentar matá-lo não era uma surpresa.
Folha - O senhor acha que o processo de paz ficará mais forte ou entraremos em um momento delicado?
Chomsky - Eu seria muito cuidadoso ao usar o termo "processo de paz". Esta é uma forma específica de processo de paz, desenhada diretamente pelos Estados Unidos e excluindo o resto do mundo. Os Estados Unidos insistiram em duas coisas que a comunidade mundial rejeitou: que Israel não se retiraria dos territórios e que não haveria direitos nacionais palestinos. E esse tipo de processo de paz incorporou as duas coisas.
Folha - O senhor acredita que nós ainda estamos distantes da criação de um Estado palestino?
Chomsky - Eu nunca pensei que a possibilidade de um Estado palestino fosse muito provável. Eu acho que é menos provável hoje do que tem sido por cerca de 20 anos. Pode aparecer algo que eles chamem de Estado palestino. Mas, na verdade, a situação na Cisjordânia remete muito à da África do Sul, nos anos 50, com os bantustões. Os bantustões eram chamados Estados, e a África do Sul os reconhecia. É possível que na Cisjordânia alguns setores possam ser chamados de Estados. Mas a idéia de um Estado independente é extremamente remota.
Folha - Neste processo, os palestinos estão mais fracos do que eram 20 anos atrás?
Chomsky - Não há dúvida sobre isso. A comunidade palestina está em absoluto desespero, sem esperança. As forças de segurança palestinas são brutais. É como uma tradicional situação colonial, que não era geralmente controlada pelas forças que tinham o poder.
Os britânicos não usavam o Exército britânico para controlar a Índia, eles usavam tropas indianas. E Israel entendeu que essa é a forma mais eficiente de exercer o colonialismo.
Folha - Apesar do fato de ter sido um soldado, Rabin deverá ser lembrado como um homem de paz. O senhor acha que essa imagem é justa?
Chomsky - Depende da força do sistema de propaganda ocidental. Se o sistema norte-americano de propaganda dominar completamente as discussões futuras, será como você disse. Se for possível para as pessoas ter a mente independente o suficiente para notar que a paz instituída é exatamente a extrema posição que Estados Unidos e Israel têm mantido sozinhos, elas terão um quadro diferente.

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