São Paulo, terça-feira, 14 de novembro de 1995
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Coletânea traz o inconformismo desesperado de Jack Kerouac

FERNANDA PIVANO
DO "CORRIERE DELLA SERA"

Com uma comovente introdução de Robert Creeley, poeta do Black Mountain College que viveu de perto os sonhos dos "beats" anos 50, saiu nos Estados Unidos a coletânea "Jack Kerouac, Book of Blues", sob os cuidados de John Sampas, irmão de Stella, última mulher do escritor.
A coletânea compreende oito grupos de poesias, das quais somente a primeira, "San Francisco Blues", já é conhecida dos leitores americanos. Kerouac escreveu esses versos em março de 1954, no hotel Cameo, em um quarto de US$ 3 a semana, sentado numa cadeira de balanço em frente à janela, olhando nas ruas "bêbados e prostitutas e carros de polícia", escrevendo depressa aquilo que via, misturado a pensamentos sobre o budismo.
Kerouac escreveu em setembro de 1953 o segundo grupo de poesias e o chamou de "Richmond Hill Blues". A primeira do grupo é "Duluoz", o nome usado por Kerouac nos últimos romances para designar a si próprio. O grupo de nome "Bowery Blues" foi datado de 29 de março de 1955 e vem precedido por uma página de prosa que descreve o caminho dos desgraçados pelo álcool, toda a tristeza e desespero com os quais Kerouac se acostumou.
O quarto grupo, "MacOugal Street Blues", datado de 26 de junho de 1955, compreende três "cantos", foi ambientado no Greenwich Village com os artistas boêmios que lá moravam. Mas era um Village visto por Kerouac através do budismo, o Bodhisattva sentado em trapos de mendigo a meditar "o Bom Deus, a Dor", "o Nenhum Futuro".
O quinto grupo, "Desolation Blues", de agosto de 1956, é constituído por 12 poesias escritas enquanto Kerouac trabalhava como guarda florestal em Mont Baker, no estado de Washington. Estava circundado por "formas negras de montanhas gigantescas" e a elas gritava perguntas metafísicas, entoava cantos evocando: "Qual o significado do mundo?".
O sexto grupo de poesias, de título "Orizaba 210 Blues", o nome da rua onde morava na Cidade do México, foi escrito em 1956, enquanto Kerouac vivia na água-furtada que fora habitada por William Burroughs e agora por William Garver, uma pessoa que fazia de tudo para habituar na droga os não acostumados.
Foi então que, em três semanas, escreveu a coletânea de poesias "México City Blues". O sétimo grupo, "Orlanda Blues", foi iniciado em 1957 e terminado em 1958, quando Kerouac viveu com a mãe em Orlando.
O livro se fecha com os versos de "Cerrada Medellin Blues", escrito em julho de 1961, na rua de mesmo nome na Cidade do México, onde Kerouac ficou por um mês, depois que se transferiu com a mãe para Flórida.
A mãe tentava protegê-lo do álcool. Quando foi "meditar na cabana de Bixby Canyon de Ferlinghetti, que lhe inspirou o romance "Big Sur", foi acometido pelo "delirium tremens".
Ao México voltou depois de quatro anos de ausência. William Garver estava morto e Kerouac vivia sozinho em um apartamento empoeirado que dava para a rua, de novo recorrendo à marijuana, Seconal e Benzedrina, tentando terminar o romance "Desolation Angels", que havia começado na Cidade do México em 1956, escrevendo à luz de vela.
Estava mais que desesperado e fez amizade com um balconista mexicano de uma loja de licores que lhe fornecia Seconal e marijuana.
Disse sempre que gostaria de "ser considerado um poeta de jazz que toca um longo blues em uma sessão de jazz numa tarde de domingo" e que as poesias dependem, "como pedaços de jazz, da espontaneidade e da inspiração". As suas eram limitadas pelas páginas de um pequeno bloco de notas que trazia sempre no bolso da calça. Se uma idéia não se exauria em uma página, seria retomada na poesia sucessiva.

Tradução de Anastasia Campanerut

Coletânea: Kerouac, Book of Blues
Lançamento: Ed. Penguin Books Poets, 274 páginas
Quanto: US$ 12,95

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