São Paulo, domingo, 19 de novembro de 1995 |
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Contribuição de Geraldo Ataliba
OSIRIS LOPES FILHO A maior prova de insensibilidade social do governo federal e de sua incapacidade de apresentar uma proposta generosa de reforma tributária se dá na área das contribuições sociais.O Fundo Social de Emergência suga e espolia o sustento financeiro dos programas de caráter social, que o governo federal deveria, por mandamento constitucional, apoiar e desenvolver. Para dar efetividade ao amparo à saúde, previdência e assistência social do povo, que compõem a seguridade social, a Constituição previu várias incidências tributárias, vinculadas ao custeio dos programas ligados a essas áreas. Concebeu-se uma forma de financiamento abrangente e universal, de tal sorte que o seu custeio fosse repartido com toda a sociedade. Assim, foram previstas como fontes de receita para a seguridade social as incidências sobre a folha de salários, o lucro líquido das empresas e o seu faturamento e os concursos de prognósticos. No exercício de 1995, são previstas as seguintes receitas para a seguridade social: contribuição social sobre a folha de salários, R$ 30 bilhões; contribuição sobre o lucro líquido, R$ 6,2 bilhões; Cofins, R$ 15 bilhões; e contribuição sobre concursos de prognósticos, R$ 500 milhões. Tem-se, assim, mais de R$ 51 bilhões que deveriam ser destinados à previdência social. No entanto, o Fundo Social de Emergência retira da seguridade 20% do seu montante -cerca de R$ 10 bilhões. Eis aí uma explicação para a ineficácia dos programas de saúde, da falência da previdência e assistência social. A área social não merece ser esbulhada, mas, sim, racionalizada. Os efeitos das incidências separadas e não integradas têm produzido muitas distorções. Um exemplo: a alíquota de 2% da Cofins, aplicada sobre a receita bruta da empresa, pode significar um peso efetivo de, no mínimo, cinco vezes mais sobre o preço final. Se houver muita intermediação, a carga efetiva se multiplica por dez. O efeito cumulativo pode acarretar alíquota efetiva de 20%, superior à média do ICMS (17%). O inesquecível mestre Geraldo Ataliba, que partiu fisicamente no dia dedicado à proclamação da República, interpretando fielmente a Constituição, doutrinou, exaustivamente, que seu artigo 195, inciso I, prevê uma contribuição a ser paga pelos "empregadores, incidente sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro. Apenas uma contribuição, dizia Ataliba, e não três como o estabelecido na legislação infraconstitucional. A insuperável vantagem de existir tão-somente uma contribuição abrangendo as três incidências -folha de salário, lucro e faturamento- é a possibilidade de seu cálculo ser integrado, sem as distorções hoje existentes. Concepção de equilíbrio, harmonia e integração. Seriam estabelecidos limites de cada incidência, para não apenar em demasia a vocação da empresa. Nesta semana triste, em que se prorroga o Fundo Social de Emergência, e que o Direito Tributário perde o calor e brilho solar de Geraldo Ataliba, cabe lembrar a sua concepção racionalizadora sobre as contribuições de financiamento de seguridade social. Há de chegar um dia em que haja um governo preocupado com a racionalidade tributária. E que siga as lições de mestres como Geraldo Ataliba, proscrevendo o apetite arrecadatório voraz e insensível. OSIRIS DE AZEVEDO LOPES FILHO, 56, advogado, é professor de Direito Tributário e Financeiro da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal. Texto Anterior: Estabilização, crescimento e importação de tecnologia Próximo Texto: Apec quer liberar comércio com cautela Índice |
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