São Paulo, terça-feira, 21 de novembro de 1995
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FHC quer saber quem comandou grampo

CLÓVIS ROSSI
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente Fernando Henrique Cardoso quer saber se foi algum de seus auxiliares mais próximos que pediu à Polícia Federal a escuta no telefone do embaixador Júlio César Gomes dos Santos, seu ex-chefe de cerimonial.
É uma demonstração de que está desmoronando versão inicialmente divulgada (e mantida ontem pelo Ministério da Justiça) de que a PF solicitara e obtivera da Justiça o grampo a partir de denúncia anônima sobre tráfico de drogas.
Agora, consolida-se a sensação de que o presidente terá de administrar uma conspiração palaciana.
Em Brasília, tanto no Executivo como no Legislativo, trabalha-se com a certeza de que a escuta só pode ter sido determinada por alguém com intimidade suficiente com FHC para que a PF entendesse a ordem como vinda de FHC.
O principal suspeito passou a ser Francisco Graziano, hoje superintendente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e, à época da escuta, secretário particular de FHC. Graziano disse considerar "uma maluquice, um absurdo" a versão de que ele detonou a escuta.
Graziano colidiu com o embaixador Júlio César ainda durante a campanha eleitoral de 94. Queixava-se repetidamente de que o embaixador encaixava "pessoas estranhas" na agenda do candidato.
Depois da posse, as divergências se mantiveram. Graziano, como secretário particular, deveria ser o controlador da agenda de FHC, mas Júlio César se intrometia constantemente, não só indicando nomes para audiências como interferindo na programação de viagens do presidente.
Para a suspeita contribui o fato de que Graziano levou para o Incra um policial federal que já trabalhara na campanha e que vem a ser irmão de Vicente Chelloti, superintendente da PF.
O policial, Paulo, conhecido como "Chellotinho", teve um atrito com o embaixador durante a campanha. Poderia ter usado seus conhecimentos na polícia e o fato de ser irmão do chefe para determinar o "grampo".
Mas a Folha apurou que a escuta não era do conhecimento nem de Chelloti nem de seu superior imediato, o ministro da Justiça, Nelson Jobim, o qual, aliás, negou ontem que a iniciativa tivesse partido de Graziano.
Mais: a presunção corrente em Brasília é a de que quem determinou a escuta sabia que iria encontrar algo, tanto que o monitoramento dos telefones de Júlio César durou apenas 28 dias (de 30 de agosto a 27 de setembro), com os resultados agora conhecidos.
O embaixador aparece como suspeito de promover tráfico de influência em favor da empresa norte-americana Raytheon, indicada para executar o Sivam, um sistema de vigilância aérea da Amazônia que vai custar US$ 1,4 bilhão.
"Quem pediu a escuta estava procurando alguma coisa grande", diz, por exemplo, o senador Gilberto Miranda (PMDB-AM), citado numa das conversas telefônicas "grampeadas" como obstáculo à aprovação pelo Senado do financiamento externo para o Sivam.
Em outra conversa, Júlio César considera "uma porcaria" uma verba de US$ 250 milhões que o governo do México pretendia investir em infra-estrutura.
"Quem acha que US$ 250 milhões é porcaria está acostumado a lidar com muito mais dinheiro", conclui o senador Miranda.
Além de Graziano, há em Brasília suspeitas sobre setores militares, descontentes tanto com o Sivam como com o embaixador Júlio César. Como chefe do Cerimonial, o embaixador passou a ter amplo controle sobre as viagens presidenciais, deslocando os militares, que, antes, davam as ordens nessa área, conforme a Folha ouviu no Itamaraty.
Gilberto Miranda acrescenta que havia um "ressentimento muito grande" no Exército por não ter sido chamado a colaborar no projeto para a Amazônia.

Colaborou Sucursal de Brasília

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