São Paulo, terça-feira, 21 de novembro de 1995
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FHC ignora crise e se diz revolucionário

GABRIELA WOLTHERS
ENVIADA ESPECIAL A MACEIÓ

O presidente Fernando Henrique Cardoso se empenhou ao máximo em sua viagem a Maceió para ignorar a crise que atingiu seu governo.
Na noite de domingo, ele assistiu a um show de música, posou para fotografias, distribuiu autógrafos a turistas e convidou jornalistas para um jantar com a condição de que não fossem feitas perguntas sobre o caso Sivam.
Ele, no entanto, não perdeu a oportunidade de alfinetar a oposição. "Não há oposição. Só existe birra", disse FHC no jantar informal oferecido no Hotel Jatiúca, onde se hospedou nos dois dias que passou em Maceió.
Ontem de manhã, durante discurso a políticos alagoanos, o presidente voltou à carga. "São poucas as oposições, e eu quero que sejam cada vez menos", disse.
"Afinal, é oposição a quê?", perguntou. Em seguida, completou: "Se for a um bom programa, está errado, pois significa oposição ao Brasil".
FHC chegou à capital de Alagoas no fim da tarde de domingo. Ele aceitou o convite do senador Teotônio Vilela Filho (PSDB-AL) para assistir ao coral da Escola Técnica Federal no próprio Hotel Jatiúca.
"A segurança não queria que ele saísse do quarto, mas o presidente não aceitou", disse Teotônio. "Ele me disse que, se dependesse dos seguranças, ele passaria o dia deitado numa cama, com todos eles ao seu redor", completou, rindo.
O coral se apresentou num tablado improvisado ao lado da piscina do hotel. Quando terminou a apresentação, FHC subiu ao palco e abraçou os artistas.
O presidente exercitou o italiano e espanhol com turistas estrangeiros. Em seguida, convidou os jornalistas para acompanhá-lo no jantar, que acabou se tornando um encontro repleto de piadas e opiniões do presidente sobre a política nacional e internacional.

REELEIÇÃO
FHC contou que, em encontro recente com o secretário de Assuntos Estratégicos, Ronaldo Sardenberg, o presidente de Cuba, Fidel Castro, disse ser favorável à reeleição. Quando os jornalistas perguntaram se se tratava da reeleição dele ou de Fidel, FHC respondeu, rindo: "Para ele, não é reeleição, ele quer a eternidade".

REVOLUÇÃO
FHC descartou uma reforma ministerial a curto prazo. "Não gosto de reforma, gosto de revolução", disse, relembrando os tempos em que a esquerda se dividia entre reformistas e revolucionários, isto é, entre os que defendiam o rompimento da ordem constituída por meio da luta armada e os que pregavam a mudança do regime por meio da política.

LITURGIA DO CARGO
O presidente dividia seu prato com o porta-voz da Presidência, Sergio Amaral, e com o senador Teotônio Vilela Filho quando foi lembrado de que isso contrariava a "liturgia do cargo".
A expressão era muito usada pelo ex-presidente José Sarney. Diante da observação, FHC emendou: "Nossa! Esqueci meu jaquetão", numa referência ao paletó trespassado na frente, com quatro ou seis botões, uma das vestimentas prediletas de Sarney.

BEBIDA
Bebericando uísque, FHC disse que não entendia por que bastava ele segurar um copo para os fotógrafos acionarem suas câmeras.
"Se isso importasse, eu não teria perdido para o Jânio", completou. FHC foi derrotado por Jânio Quadros, que tinha fama de gostar de beber, na disputa à Prefeitura de São Paulo, em 1985.

BIGODUDO
Ao comentar a eleição ocorrida ontem na Polônia, FHC disse que, na sua opinião, o presidente Lech Wallesa, que ele chama de "bigodudo", era um pouco "tosco".
No jantar, FHC também afirmou que "não teve química" com o presidente theco Vaclav Havel, que conheceu na viagem antes da posse. "Só porque escreve peças de teatro pode ser presidente?", perguntou.

ATOR
Quando o assunto foi cinema, o presidente da República lembrou que foi convidado pelo cineasta Glauber Rocha para participar de um de seus filmes. Ele disse que recusou por não ter jeito para a coisa e que nem sequer se lembra que filme era.

PRIMOS RUSSOS
Ao relembrar que tem parentes por todas as partes, FHC disse que ajudou um casal de primos seus a se mudar da Rússia para o Rio.
Segundo ele, os primos estavam sendo ameaçados pela máfia russa, que "está tomando conta do país". FHC recebeu o pedido de ajuda e acionou o Itamaraty.
Ele afirmou que não foi pedido exílio, que tudo foi negociado informalmente.

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