São Paulo, quinta-feira, 23 de novembro de 1995
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O Corvo

"Take thy beak from out my heart, and take thy form from off my door! / Quoth the Raven, 'Nevermore"' (Tira o bico de meu coração, tira o corpo da minha porta! / Disse o Corvo: "Jamais").
Foi provavelmente a esses versos de Edgar Allan Poe que o presidente Fernando Henrique Cardoso se referiu ao comentar ontem o caso Sivam. Para FHC, é preciso retirar do país esse "espírito de corvo", "de ver podridão em tudo".
Um pouco de confiança na alma humana de fato sugere que existem pessoas com real espírito público, que querem o melhor para o país sem tentar obter vantagens pessoais. Fernando Henrique é, ao que tudo indica, um desses homens, infelizmente raros.
A prudência e a experiência recomendam, contudo, a prestar a máxima atenção a todos os atos de governantes, principalmente quando o montante de dinheiro envolvido é inicialmente de US$ 1,4 bilhão, o segundo maior contrato em curso em todo o planeta.
O presidente, na defesa do projeto, chegou a cair em contradição ao afirmar que até agora ninguém foi capaz de apontar "uma, uma só" irregularidade no processo. Logo depois afirmou: "e quando disseram (apontaram uma) -que era verdadeira- eu não assinei o contrato e tirei a Esca". Fica claro, portanto, que pelo menos uma irregularidade ocorreu. As suspeitas sobre muitas outras são bastante sólidas.
Assim, por melhores que sejam as intenções de um governante -que, de resto, é uma figura transitória no quadro institucional-, cabe à sociedade civil e à imprensa, para resguardar o erário e a ética na política, manter-se atentas a tudo o que ocorre nos meandros do poder público. Dada a natureza humana, é preciso repetir as palavras do corvo: "Jamais".

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