São Paulo, domingo, 26 de novembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Ex-garçom se prepara para inaugurar fábrica em SP

EDUARDO BELO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um engenheiro civil que jamais pôs a mão no diploma, já trabalhou como mordomo de hotel no Brasil e foi garçom no norte da Itália se prepara para virar industrial. João Zangrandi, 35, inaugura em abril do ano que vem a primeira unidade da indústria italiana de eletrodomésticos Polti fora da Europa.
Os 12 mil metros quadrados da fábrica estão sendo construídos em Araras (170 km a noroeste de São Paulo), com a missão de produzir por mês 10 mil unidades do Vaporetto, um aparelho de limpeza que utiliza vapor de água sob pressão e é o carro-chefe de vendas da Polti.
A unidade vai empregar 250 pessoas e deve abastecer, além do Brasil, também o Mercosul (Mercado Comum do Sul) e o Chile. A previsão de faturamento é de US$ 50 milhões até o final de 1996.
Em três anos e com apenas US$ 1.000, Zangrandi passou de empregado a sócio (com 40% do negócio) do empresário italiano Franco Polti.
Em 1992, o brasileiro andava pela rua no norte da Itália quando deu de cara com um exemplar da revista de negócios "Millionaire".
A reportagem de capa contava a vida de Polti, então com 52 anos, um ex-operário que montou na garagem de casa uma oficina para produzir um ferro de passar a vapor de uso doméstico com a mesma pressão dos equipamentos profissionais, usados em lavanderias.
Zangrandi viu que a história de Polti tinha um paralelo com a sua. Escreveu uma carta contando que era um engenheiro que tinha ido à Itália para tentar a sorte. Já havia trabalhado como garçom em Trevisso e como representante de uma fábrica de máquinas industriais do grupo Fiat na região de Turim.
"Aquilo o tocou", diz Zangrandi. Polti percebeu que ali estava um jovem atrás daquilo que ele próprio havia procurado: uma oportunidade.
Naquela época, Zangrandi já pensava em aproveitar a abertura econômica promovida pelo governo Collor para voltar ao Brasil e importar algum produto, mas ainda não sabia o quê.
"Eu achava que o Brasil poderia ser um grande receptor de produtos europeus de qualidade."
Chamado para trabalhar com Polti, Zangrandi propôs abrir uma representação da empresa no Brasil. Os dois desembarcaram no país e o italiano se entusiasmou com o que viu: disse a Zangrandi que ele poderia superar a Alemanha, até então o terceiro maior mercado, dos 28 em que a Polti atua. O brasileiro riu.
Zangrandi foi convidado a trabalhar na fábrica por seis meses, para conhecer o funcionamento da empresa -e dos produtos.
Foi quando revelou ao patrão que só dispunha de US$ 1.000, quantia suficiente apenas para comprar dois Vaporetto (à venda no Brasil por cerca de R$ 460).
O empresário permitiu que Zangrandi trouxesse da Itália um contêiner com 300 unidades do aparelho para venda em consignação.
Atuando de porta em porta, Zangrandi conseguiu vender 1.500 unidades em 1993.
No ano seguinte, contra uma meta de 5.000 unidades, vendeu 17 mil, depois de passar a distribuir o produto em magazines.
Para este ano, a meta era de 50 mil, mas as vendas do primeiro semestre somaram 40 mil unidades. O ano deve encerrar com 90 mil aparelhos vendidos, fazendo do Brasil o terceiro mercado para a Polti, com faturamento de US$ 37 milhões no país, atrás somente de Itália e França.
No início do ano, Franco Polti decidiu trazer para o Brasil o investimento de US$ 15 milhões para construir no interior paulista a fábrica que deveria ir para os Estados Unidos -onde a marca está chegando, a partir do Brasil.
Zangrandi tem participação de 20% da marca no mercado norte-americano. Além disso, mantém uma loja para venda exclusiva de produtos Polti (além do Vaporetto). Quem toma conta da loja, na zona sul de São Paulo, é Mariane, 30, sua mulher e sócia.
Os dois se conheceram quase por acaso, quando ele ainda cursava engenharia em Ribeirão Preto. Sem saber como sair da cidade para voltar a São Paulo, ela pediu informações a Zangrandi. Ele pediu o telefone da moça "para saber se ela havia chegado bem em casa".
Casaram e, em 1987, esperando o segundo filho, foram para a Itália tentar a sorte, depois de Zangrandi ter vivido uma malsucedida tentativa de trabalhar na rede de restaurantes do sogro.
Tendo cursado somente o segundo grau, Mariane disse aos italianos que havia se formado em educação física no Brasil. Eles acreditaram e ela acabou trabalhando uma temporada como professora de natação para crianças.
Zangrandi diz que tem reinvestido todo o retorno da empresa e se limita a uma retirada mensal de R$ 10 mil como pro-labore -fora o ganho com a loja.
Ele pretende repetir essa rotina pelos próximos dois anos, tempo em que espera pôr a fábrica em operação plena e aumentar a linha de importados da marca.
Além da construção da unidade de Araras, a empresa investiu este ano US$ 3 milhões em marketing. A marca patrocina o corredor de Fórmula 1 Rubens Barrichello (depois de ter patrocinado o bicampeão Michael Schumacher) e o time de basquete de Rio Claro.
No Brasil, a Polti atua principalmente nos mercados de São Paulo, Rio, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.

Texto Anterior: Mais subsídios aos bancos?
Próximo Texto: RAIO-X DA EMPRESA
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.