São Paulo, quinta-feira, 30 de novembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Debate discute criação de novas fronteiras nas metrópole

s

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Aquelas linhas divisórias para as quais se precisa um passaporte foram apenas algumas entre as "fronteiras" debatidas anteontem na PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) pelo cientista político Paulo Sérgio Pinheiro e pelo geógrafo Milton Santos.
Os dois professores da USP (Universidade de São Paulo) participaram de um debate com esse tema, dentro da série "Diálogos Impertinentes", promovidos pela PUC-SP e pela Folha.
O debate teve mediação de Caio Túlio Costa, diretor-executivo da Folha Online, e de Mário Sérgio Cortella, professor do Departamento de Teologia da PUC-SP.
"As fronteiras desmontam a idéia de globalização", disse Pinheiro; "em termos de direitos humanos as fronteiras são desastre".
Os dois debatedores concordaram que, dentro de uma mesma cidade -principalmente as grandes metrópoles brasileiras- "você tropeça em fronteiras".
Pinheiro citou pelo menos uma positiva. Durante a administração em São Paulo da prefeita petista Luiza Erundina, se descobriu que era possível delimitar um espaço público, como uma praça, dentro de um favela. Os favelados gostaram da experiência.
Pinheiro citou como exemplo dessa tendência de criação de fronteiras a explosão dos condomínios fechados, "cidades muradas", objeto de estudo da socióloga Teresa Caldeira, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
"A 10 km do marco da praça da Sé há uma fronteira indelével", disse ele, "ainda mais se o sujeito for não-branco".
"Nós somos um país brejeiro, cordial, mas cheio de fronteiras", disse. "O brasileiro é antes de tudo um dissimulado", completou.
O cientista político citou o detalhado estudo feito pela PUC sobre as diferenças entre os bairros paulistanos com relação às condições de vida -como acesso à educação, saúde, água e esgoto, renda etc-, publicado pela Folha em um caderno especial na edição do último domingo.
Milton Santos, ele próprio negro, disse que ficou particularmente irritado com o decreto assinado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso no dia 20 de novembro, data do tricentenário da morte do líder negro Zumbi.
"É uma vergonha, um desaforo". Para ele, o governo não fez nada em termos de políticas compensatórias para os negros.
O debate teve momentos bem-humorados. Quando Pinheiro falou de sua insatisfação com a questão racial no país, e se definiu como "branco", Santos perguntou: "Você tem certeza que é branco?" Depois das risadas, se disse "honrado" com a possibilidade de ter negros na família.
O debate "Fronteiras" foi o último do ano da série "Diálogos Impertinentes", promovida pela Folha e pela PUC-SP.

Texto Anterior: Músico viaja pelo passado
Próximo Texto: Homem deve saber ser verdadeiro
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.