São Paulo, sexta-feira, 1 de dezembro de 1995
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Excesso de fantasmas assombra 'Ilusões Perigosas'

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Filme: Ilusões Perigosas
Produção: Inglaterra, 1995, 110 min.
Direção: Lewis Gilbert
Elenco: Aidan Quinn, Kate Beckinsale, Anthony Andrews, John Gielgud
Onde: a partir de hoje nos cines Olido 3, Butantã 3 e circuito

Um espectador imaginário que tivesse os minutos contados poderia assistir apenas à primeira cena de "Ilusões Perigosas" (Haunted). Após uma brincadeira, um menino persegue sua irmã.
Consegue agarrá-la quando ela está atravessando a ponte. A menina bate com a cabeça numa pedra, cai no rio e morre.
Vindo de Lewis Gilbert -do morníssimo "Shirley Valentine"- é de surpreender, uma cena realizada com tristeza e convicção, capaz de nos introduzir ao futuro sombrio reservado a David Ash (Aidan Quinn), o irmão da cena inicial, que agora, adulto, dedica-se a combater o que considera falsos fenômenos psíquicos.
O início nos leva a um terror real: um homem assombrado pelo fantasma da culpa, que carregará, irremissivelmente, pela vida. Na qualidade de professor, e cético, parece nos remeter, no momento inicial, a "A Noite do Demônio", de Jacques Tourneur.
Mas é depois, quando ele volta a seu local de nascimento em busca de novas fraudes no setor assombrações, que o filme se define.
Entramos, daí por diante, no terreno do Mizoguchi de "Contos da Lua Vaga".
Aqui, "Ilusões Perigosas" oscila perigosamente. David topa com dois irmãos e uma irmã, Christina (Kate Beckinsale). Alude a um caso de incesto.
Investiga os terrores por que passa uma senhora (governanta da casa), prega alguns sustos no espectador.
Se "Ilusões" não se afirma como filme de primeira é, em parte, porque nunca se sabe direito com o que devemos nos entender: com o fantasma (no sentido psicológico, não fantástico) da irmã morta, com outros possíveis fantasmas, com a dor irreparável da perda na infância, com a busca do amor, com a necessidade de se libertar do passado e tocar para frente.
Todos esses temas são sugeridos e lançados pelo filme, bem como o do amor como uma conquista contra a civilização.
Mas é no meio dessa multidão de assuntos -todos eles significativos- que Gilbert parece hesitar em pôr em relevo um deles, destacando-o, deixando os demais condicionados a ele.
É nessa medida que "Ilusões Perigosas" perde um tanto da força que poderia ter. Não é vulgar, nem idiota, ou comercial.
Tem alguns momentos muito fortes, em que a atmosfera é muito bem construída.
É um filme a que falta direção, no sentido mais amplo da palavra: a capacidade de discernir entre sentidos, atribuir ênfases, omitir, manter o delicado equilíbrio entre o real e o ilusório, não se perder nas inúmeras possibilidades que um argumento abre.
Ainda assim, um filme bem assistível. Para isso ajuda a atriz Kate Beckinsale, belíssima.

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