São Paulo, quarta-feira, 6 de dezembro de 1995
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Respostas em falta

JANIO DE FREITAS

Apesar de tudo o que já foi escrito e dito no caso do "grampo", algumas questões persistem sem resposta ou respondidas de modo a mais encobrir do que expor. Não será por coincidência que as questões assim tratadas sugerem-se também como das mais incômodas.
Foram de fato desgravadas as matrizes da escuta clandestina, preservando-se apenas os trechos referentes ao Sivam? Mesmo que se quisesse acreditar neste absurdo, as várias inverdades emitidas pelo governo, e pelo diretor da Polícia Federal em particular, não permitiriam tamanha boa-fé. A alegação não tem valor também sob outro ponto de vista: ainda antes de revelada por "IstoÉ" a existência da gravação, as matrizes haviam deixado de ser o repositório único do seu conteúdo. A gravação passou por numerosas mãos e ouvidos. Com certeza, há cópias e o governo nem sabe quantas estão fora do seu alcance.
A desgravação foi alegada para evitar que a comissão especial do Senado, incumbida de examinar o Sivam, requisitasse a gravação integral, o que acabaria proporcionando à imprensa o conteúdo ainda não revelado. E desde então nota-se outra zona de sombra no episódio: a passividade com que o Senado, embora necessite do máximo de informações para uma avaliação séria do Sivam e do que se passa à volta do projeto, aceitou receber do governo apenas a gravação do que todos os senadores já haviam lido nas transcrições da imprensa. Em conversas, a descrença na desgravação é absoluta; no exercício da função, nenhum questionamento.
Moeda real

A aliança PSDB/PFL criou expectativas que a realidade está confirmando, mas com os termos invertidos. Tudo o que era esperado do PFL, em práticas comprometedoras da lisura e da eficiência do governo, tem acontecido por obra de peessedebistas. É exemplar, nesse sentido, a virgindade do PFL no atual coquetel de tráfico de influência, traições, escuta clandestina, mentiras oficiais contra a opinião pública, e o mais que ainda está por aparecer. Na ânsia de prestar serviço ao presidente Fernando Henrique, porém, uma ala pefelista começa a enredar-se, e ao partido, em comprometimentos desnecessários e gratuitos.
Inquieto com os riscos de investigações em torno do seu senador Gilberto Miranda, o PMDB ameaçou o governo com um pedido de CPI para o Sivam e adjacências. Algumas conversas de peemedebistas com Fernando Henrique bastaram para acalmar o partido. Como, na política brasileira, nada se passa fora do jogo das compensações, tratava-se, cá fora, de descobrir que moeda circulou nas conversas do presidente com a liderança peemedebista.
Em uma face da moeda está a efígie de Gilberto Miranda; na outra, a sigla PFL. O valor é alto: liquida, a um só tempo, os riscos do senador e a virgindade do PFL. Na transação, o PMDB recebeu a garantia de que o seu senador, por mais negativos que sejam os indícios de sua ação no projeto Sivam e nas gravações grampeadas, ficará imune a investigações. Com proteção assegurada pelo PFL, em operação que o líder Elcio Alvares iniciou prontamente, assimilando e propagando a tese peemedebista de que a comissão especial do Senado não tem competência para incluir Gilberto Miranda nos objetos de investigação.
Até então, era o PFL, sobretudo por intermédio do senador Antônio Carlos Magalhães, presidente da comissão, o defensor de investigação sem restrições de pessoas e de entidades. De acordo, aliás, com a opinião mais generalizada sobre as figuras e os fatos do Sivam. O que vai se passar no PFL é, portanto, mais um ingrediente a engordar a embrulhada, com a possível consequência de que Fernando Henrique junte, aos seus já protegidos, até o senador envolto em suspeitas que nem se limitam ao Sivam.

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