São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 1995
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Especialista dos EUA ensina a imitar homem

OTÁVIO DIAS
DE LONDRES

A onda drag king, já existente em cidades norte-americanas como São Francisco e Nova York, começou a chegar a Londres em junho do ano passado, quando foi criada, em um club da cidade, uma noite especial para drag kings, chamada Naive.
Em setembro de 94, a norte-americana Dianne Torr, especialista no assunto, viajou de Nova York para Londres para coordenar workshops no Instituto de Arte Contemporânea.
Durante os workshops, Torr ensinou técnicas de como se vestir e se comportar como um homem (leia texto abaixo). Finalmente, em março passado, a moda pegou com a realização no primeiro concurso de drag kings.
O ponto de encontro oficial dos drag kings é às segundas-feiras na noite Naive, realizada no club Madame JoJo's, no Soho, bairro localizado no centro de Londres.
No pequeno club de paredes forradas de veludo vermelho, todos os tipos de "homens" se encontram, de cowboys a adolescentes revoltados, de operários a homens de negócios.
Os comportamentos variam, é claro, de acordo com o estilo de cada um. Há desde drag kings machistas e rudes a autênticos cavalheiros, mas o clima que predomina é de uma camaradagem tipicamente masculina.
A partir de fevereiro de 1996, Naive passará a acontecer nas noites de sábado, uma vez por mês, o que deve dar um novo impulso ao movimento.
"Vamos passar a nos encontrar no Substation South, um club bem maior no bairro de Brixton, ao sul de Londres", diz Jewels, 24, uma das promotoras de Naive.
Para Jewels, o segredo para atuar bem como um drag king é observar o comportamento dos homens no dia-a-dia.
"No metrô e nos ônibus, por exemplo, os homens equilibram-se melhor que as mulheres porque mantêm as pernas abertas e paralelas. Quando sentados, ocupam muito mais espaço", diz Jewels.
"Eles também não se assustam diante de um prato cheio de comida, enquanto as mulheres costumam dizer 'oh, isso é muito para mim"', continua.
A cineasta austríaca Hans Scheirl, 39, há cinco em Londres, teoriza sobre o que significa ser drag king. "Acho que as palavras homem e mulher são uma construção da sociedade. As características vistas como masculinas e femininas são falsas, elas vão além de nossas diferenças biológicas."
Segundo ela, os papéis masculino e feminino foram criados por uma sociedade baseada na necessidade de reprodução: "Isso mudou. O mundo está cheio e a reprodução não é mais o principal objetivo da humanidade".
"Eu gostaria de ir para um lugar onde o gênero não fosse fixo, onde o gênero fosse uma linguagem, não um jeito estático de ser", diz. Scheirl usa roupas de garoto desde os tempos de escola na Áustria. Aos seis anos, ela usava calças, enquanto as outras meninas usavam saias.
"Meus pais eram muito liberais e eu queria usar roupas práticas, que me permitissem subir nas árvores e me divertir", explica.
Embora não ajam de maneira tão exuberante quanto as drag queens, a diversão também é fundamental para os drag kings.
"Eu quero fazer paródia", diz Scheirl. "Gosto de reunir tudo que acho interessante em homens e mulheres, brincar com isso e fazer algo especial para mim mesmo."
Como drag king, Scheirl faz o estilo dândi ou "aristocrata empobrecido". Veste roupas do interior da Inglaterra e paletós austríacos, botas de montaria e acessórios de montanhismo. Ela foi a vencedora do primeiro concurso de drag kings do Reino Unido, realizado em março deste ano, no National Film Theatre, em Londres.
Em breve, os drag kings estarão presentes também em uma das mais tradicionais instituições do Reino Unido.
No início de 96, Jewels e a fotógrafa Della Grace coordenarão um workshop sobre o assunto na Universidade de Cambridge, a mais prestigiosa do país junto com a Universidade de Oxford.
(OD)

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