São Paulo, segunda-feira, 18 de dezembro de 1995
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Russo deixa de ser eterno adolescente

FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

Há doze anos na estrada do rock brasileiro com o Legião Urbana, Renato Russo solta a voz e deixa que o romântico supere o roqueiro em "Equilibrio Distante", um disco só com canções do pop italiano.
"Quem nunca se apaixonou?", pergunta Renato, 35, ele mesmo um romântico declarado, embora afirme que não esteja apaixonado atualmente.
Ele diz que o disco é um momento de maturidade, um projeto no qual se envolveu cantando e produzindo, e que está satisfeito em fazer música porque "desde criança queria ser como os Beatles".
A maior dificuldade de "Equilibrio Distante", conta ele, foi que o Renato cantor queria um disco com 19 músicas, mas o Renato produtor reduziu a 13 o número de canções.
Segundo disco solo de Renato Russo -o primeiro foi "Stonewall Celebration", com repertório em inglês-, "Equilibrio Distante" já vendeu, segundo o cantor, 130 mil cópias em três semanas de lançamento.
Seu próximo projeto é a gravação do sétimo disco do Legião Urbana. Está terminando de compor e selecionando o repertório. Em entrevista à Folha, Renato Russo falou sobre as canções italianas do novo disco, sobre o grupo Legião Urbana e sobre românticos e roqueiros:

Folha - De onde surgiu a idéia de cantar em italiano?
Renato Russo - Fui numa loja de CDs e vi a seção de música italiana. Tenho muita curiosidade por música pop de vários lugares. A esmo, peguei vários discos e me apaixonei perdidamente.
Achei a temática das letras muito parecidas entre si e muito parecidas com a temática da Legião Urbana -o indivíduo frente à sociedade, a ética e canções de amor belíssimas.
O disco ficou sendo uma homenagem à minha família, porque sou descendente de italianos em terceira geração, e uma homenagem aos 150 anos de imigração italiana no Brasil.
Folha -O que você achou do resultado?
Renato - Fiquei surpreso como a minha voz se adapta a este estilo italiano de cantar. Eles colocam a voz muito para fora, soltam a voz. O Emílio Santiago canta assim, com vozeirão.
Descobri que funcionava perfeitamente para minha voz. Não sei se eu daria muito certo cantando bossa nova, embora possa tentar. Não falo italiano e precisei de ajuda para pronunciar os "es" finais, que o carioca às vezes fala como "is". No resto, fui na intuição. E fiquei feliz com meu italiano no disco.
Folha - Você não teme ser chamado de brega, cantando as músicas italianas tradicionalmente derramadas?
Renato - A intenção era fazer um disco brega. O que é que é o brega? A canção extremamente popular e extremamente romântica. Eu queria fazer um disco romântico e lírico, para lidar com outra linguagem.
Rock and roll não tem regra, você faz o que der na telha. A música pop tem convenções, você não pode fazer qualquer coisa. Isso me atraiu.
Folha -Qual é a fronteira que separa o romântico e o brega?
Renato - Não costumo parar para analisar. O que eu sei é que o que a gente chama da brega é o romântico popular.
O que eu quis colocar é que se pode ser verdadeiro e fazer um trabalho de qualidade com um material para o qual as pessoas torcem. É que nem "Sonhos", do Peninha. Muita gente só prestou atenção na música, que é linda, quando Caetano gravou.
Folha -E você também é romântico?
Renato - Muito romântico. Já fiz canções românticas para o Legião, e o meu primeiro disco solo, "Stonewall", só com músicas em inglês, também é romântico. Só que esse romantismo aumenta nesse disco novo, é um disco para namorar, relaxar. Meus amigos nem ficaram surpresos quando viram o resultado, porque já me conhecem e, antes de gravar o disco, eu dizia: "olha como são lindas essas canções italianas".
Folha -O roqueiro se sente em crise aos 35 anos?
Renato - Mais ou menos, esse disco é até uma maneira de validar meu trabalho sem ser eterno adolescente. Às vezes ouço uma música e acho bonito trabalhar nisso. Eu sempre quis ser que nem os Beatles, e, de repente, a gente conseguiu e continua trabalhando e tendo respeito.
Tô mais tranquilo, não bebo mais, não uso mais drogas, isso me traz uma serenidade que eu não tinha. Parei porque eu tava me matando. Continuo a mesma pessoa, mas a gente amadurece. Estou com 35 anos, não tenho mais 18.

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