São Paulo, quinta-feira, 21 de dezembro de 1995
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FHC rebate Luís Eduardo e diz não ser cria da 'ditadura'

MARTA SALOMON; DANIELA PINHEIRO
ENVIADA ESPECIAL A MADRI

Surpreendido pelas declarações feitas na véspera pelo deputado Luís Eduardo Magalhães (PFL-BA), de que falta "comando" ao governo, o presidente Fernando Henrique Cardoso rebateu ontem: "O governo não tem é arbítrio, mas comando tem".
Numa indireta aos seus aliados do PFL, que deram sustentação política aos governos militares (64-85), FHC completou, em seguida, o raciocínio. "Arbítrio não, porque eu fui criado contra a ditadura e não pela ditadura", disse.
FHC não telefonou ontem para Luís Eduardo nem recebeu nenhum telefonema do presidente da Câmara até a hora de embarcar de volta de Madri para o Brasil. A comitiva presidencial fez uma escala na capital da Espanha ao retornar de visita à China e à Malásia.
O presidente soube das declarações públicas do deputado do PFL pela sinopse dos jornais brasileiros, durante o café da manhã.
"Deve ter sido em algum jantar alegre, brincando, como eu sempre faço" -foi a primeira reação do presidente, tentando relevar o episódio. "São brincadeiras que ele faz. Quando está comigo, ele faz também, eu faço com ele, não há problema."
Ao saber que Luís Eduardo cantarolara o trecho da música "Apesar de Você", de Chico Buarque, e dedicara a ele o trecho "Você vai pagar e é dobrado", o presidente perdeu a calma.
"Vamos parar de fazer esse tipo de jogo porque eu não nasci ontem. Muitas vezes brinco com a, com b, com c. Ou nós levamos o Brasil a sério, ou vamos passar a vida transformando essa brincadeira numa crise."
Apesar das declarações do presidente da Câmara, Fernando Henrique encheu o deputado de elogios: "Um deputado consequente, um grande presidente da Câmara".
FHC costuma dizer que o pefelista é um dos políticos mais ligados a ele. O presidente queria tê-lo como vice na chapa que disputou o Palácio do Planalto, em 94.
Durante a semana que passou na Ásia, Fernando Henrique telefonou para o deputado, que ameaçava romper com o governo por causa do vazamento de registros de doações do Banco Econômico para a campanha eleitoral de 1990.
Depois da conversa, FHC entendeu que a crise com o PFL havia passado. "O que parecia uma tempestade, virou uma coisa normal", relatou.
Dois dias depois do telefonema da conciliação, FHC ironizou o PFL de Luís Eduardo ao dizer que o partido não tinha motivos para criticar o ritmo do processo de privatização, já que cabia ao ministro pefelista Raimundo Brito (Minas e Energia) tocar o processo.
Enquanto FHC rebatia as críticas do pefelista, o secretário-geral da Presidência, Eduardo Jorge Caldas Pereira, entrava na operação para apaziguar os ânimos entre o governo e o PFL e transformou os ataques do deputado em um "simples desabafo que não deveria ser publicado pela imprensa".
"Luís Eduardo continua a ser um aliado fiel e muito importante. É uma pessoa que merece toda nossa consideração. Desabafos pessoais em um clima descompromissado não deveriam aparecer nos jornais", disse à Folha.
"Qualquer suposto desentendimento sentido pelo deputado Luís Eduardo deve ser esclarecido entre ele e o presidente", afirmou Eduardo Jorge. Segundo ele, FHC e o pefelista devem se encontrar ainda hoje, em Brasília, para "sentar e conversar".

Como não há vôos comerciais regulares entre Pequim e várias cidades da China e da Malásia que o presidente Fernando Henrique Cardoso visitou desde sexta-feira, a Folha foi convidada e aceitou percorrer esses trechos, inclusive entre Kuala Lampur (Malásia) e Madri, no avião reserva da Presidência. Todas as outras despesas de transportes, hospedagem e comunicação correm por conta do jornal.

Colaborou DANIELA PINHEIRO, da Sucursal de Brasília

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Sobre a viagem de FHC às págs. 1-5 e 1-8

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