São Paulo, domingo, 24 de dezembro de 1995
Próximo Texto | Índice

Chave sem porta

Um dia depois do anúncio do corte de juros nos Estados Unidos, o Banco Central do Brasil agiu como se a sua sede estivesse em Marte ou mesmo fora do Sistema Solar (o Sol, no caso, sendo a economia norte-americana).
O Conselho Monetário Nacional, que no tempo do regime militar era de fato um conselho e que o regime democrático transformou num encontro de burocratas a portas fechadas, editou medidas frustrantes. E o Banco Central, espécie de coração do CMN, ainda não fez aquilo que é mais esperado, a saber, reduzir as taxas de juros domésticas.
A partir de hoje, portanto, já começa a contagem de novos e desnecessários prejuízos ao Tesouro Nacional provocados por uma política de juros extraterrestres.
No campo das pequenas empresas, as medidas poderiam muito bem ser qualificadas de poéticas. Enquanto o impacto da contração econômica faz milhares de vítimas individuais e empresariais, o governo abriu possibilidades bastante limitadas de aumento das operações de crédito a empresas inadimplentes. Limitação ainda maior sob a atual política de juros reais que, na margem, pode até mesmo elevar os níveis de inadimplência.
Entre os bancos, o que se vê nas últimas semanas é uma "federalização" das operações financeiras, ou seja, os bancos reduziram muito o volume de operações interbancárias para emprestar cada vez mais ao próprio governo.
Se o governo é o grande absorvedor de recursos, e os bancos estão com medo de emprestar até mesmo para seus "pares", que dizer da idéia de amparar pequenas empresas inadimplentes?
Quanto mais prolongado o regime de juros reais exagerados, mais difícil a superação da crise de crédito. Para o BC, entretanto, a rota de menor risco ainda é adiar ao máximo a queda dos juros.
A autoridade monetária fica assim praticamente imóvel esperando que um dia a porta pare no lugar e encontre a chave. O BC tem a chave na mão, mas parece agir com extremada cautela, receoso de quais portas deve abrir.

Próximo Texto: Escárnio
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.