São Paulo, segunda-feira, 25 de dezembro de 1995
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Do mesmo saco

MARCELO BERABA

SÃO PAULO - As fitas de vídeo sobre a Igreja Universal são preciosidades jornalística e antropológica que ajudam a entender o funcionamento e o discurso de uma corporação que virou fenômeno mundial.
Mas há um tanto de hipocrisia na forma como a Rede Globo vem explorando as fitas.
Não acredito que a razão principal seja uma santa indignação diante das cenas de explícito cinismo mercantilista como as filmadas após uma partida de futebol em que o bispo Edir Macedo, sem subterfúgios, ensina seus seguidores a ganhar dinheiro.
Esta parte do vídeo é uma peça rara, por sua espontaneidade, para se entender o discurso pentecostal e sua ação aguerrida. O bispo falava, de forma clara e direta, para o seu público interno.
Quanto ao conteúdo do discurso -que seria a prova definitiva de como a igreja "ludibria" os "ignorantes" e lhes arranca dinheiro em nome de Deus- não se diferencia muito daqueles que ouviríamos da maioria dos políticos se os flagrássemos com seus cabos eleitorais.
Arrancar dinheiro dos ignorantes? Condená-los por isto é o mesmo que aceitar a censura à TV Globo por seus programas alienantes.
Dizer que exploram a ignorância do povo é substimar a inteligência das pessoas e é uma forma de lavar as mãos.
Não há outro caminho para o fim de uma situação como esta senão pela distribuição da renda, da educação e das oportunidades. Não há caminho via censura ou perseguição religiosa.
A Universal vem cometendo crimes, como o de contrabando, remessa ilegal de dinheiro para o exterior ou o uso de caixa dois? Que seja investigada.
O que a TV Globo mostrou como escândalo moral são cenas normais em qualquer grupo com identidade comum. Ou alguém acha que padres não dançam forró e frequentam bons lugares?
O bispo Macedo quer ser presidente da República? É um direito dele, desde que pelas vias democráticas.
A TV Globo omite, ao convidar seus telespectadores a participar de um linchamento, as razões de sua intolerância.
Nenhum grupo de telecomunicações vem crescendo tão rapidamente como o da Record. A questão religiosa é apenas um pretexto para inibir um concorrente.
Há anos assistimos os dois filmes: o do charlatismo da Universal e o da truculência da Globo.

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