São Paulo, terça-feira, 26 de dezembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O ano de Pelé

JUCA KFOURI

Em 1977 ele se despediu do futebol pedindo amor e foi tratar da vida, coisa que não havia conseguido até então -entre outras coisas porque também foi rei em arrumar sócios mais espertos que a esperteza.
Em 1969, ao marcar seu milésimo gol, pediu atenção às crianças do Brasil e foi chamado de demagogo.
Depois, pediu aos brasileiros que votassem seriamente e disseram que ele achava que o brasileiro não sabia votar.
Encontrou no socialista moreno Hélio Viana seu braço direito e passou a ganhar o que merecia, embora o novo sócio não fosse bem aceito pelos amigos mais próximos e muito menos pelo grande mundo dos negócios, dadas as características do parceiro -um homem sem maiores sutilezas, que diz o que pensa e de origem humilde da cidade de Volta Redonda.
Nome mais conhecido do mundo, Pelé progrediu e virou ministro.
Viana joga de zagueiro, faz marcação cerrada na defesa dos interesses comuns, dá pontapés quando preciso e raramente amacia. É de uma lealdade absoluta.
Pelé brilha, livre e solto, confiante na retaguarda.
E tem uma estrela maior que sua majestade.
O amor que pediu ao mundo ao se despedir do Cosmos em Nova York a humanidade lhe dedica em doses infinitas. De fato, seu reinado parece eterno.
As crianças para as quais pediu atenção estão em número cada vez maior nas esquinas brasileiras e é para elas que ele tenta fazer alguma coisa com os parcos recursos de seu ministério, responsabilidade que aceitou por acreditar, finalmente, que o brasileiro votou seriamente.
O país quase veio abaixo quando ele disse que corrupção e política eram sinônimos e nem bem passada uma semana explodiu o escândalo da CPI do Bingo.
Em sua extrema simplicidade, Pelé faz as coisas como acha que elas devam ser feitas.
E sem maiores mágicas, quase que só dando palpites, suas idéias permitiram que o Santos ressuscitasse depois que ele tirou um presidente e pôs outro, seu amigo de longos anos.
Ser ministro é mais complicado. Há quem queira que Pelé intervenha na CBF que ele também, antes de ser ministro, acusou de corrupta.
Mas sabe que o papel do Estado no esporte está muito além disso.
Gosto cada vez mais dele que, com todo prestígio que tem, é vacinado contra o deslumbre da mosca azul.

Texto Anterior: Notas
Próximo Texto: Federação permite uso de TV nos bancos de reservas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.