São Paulo, quinta-feira, 28 de dezembro de 1995
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A privatização estadual

LUÍS NASSIF

Na semana passada, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deu início a um capítulo importante em sua reciclagem, assumindo o papel de indutor da privatização de empresas estaduais.
Exposto a um amplo processo de emburrecimento a partir do governo Sarney, processo ampliado no governo Collor -quando seu corpo técnico voltou-se exclusivamente para o trabalho burocrático da privatização a preço de banana-, o banco começa a se reencontrar dentro do novo modelo de globalização da economia -que ele ajudou a prever e a moldar a partir dos estudos de seu corpo técnico, ainda no governo Figueiredo, que resultaram no modelo de abertura do governo Collor.
Em menos de uma semana, foram fechados três contratos de privatização com os governos mineiro, gaúcho e paranaense, em torno, respectivamente, da Cemig (Centrais Elétricas de Minas Gerais), CRT (Companhia Riograndense de Telefonia) e Copel (Companhia Paranaense de Eletricidade).
A fórmula baseou-se no modelo apresentado meses atrás pelo secretário da Fazenda de Minas Gerais, João Heraldo.
Cada Estado cria uma espécie de caixa de administração da dívida estadual. Depois, aporta na caixa ações de estatais estaduais. Tendo por lastro essas ações, candidata-se a linhas de financiamento do BNDES, tendo por meta a privatização futura das empresas.
O banco entra com os recursos e com a assessoria para a modelagem da privatização, por intermédio de um departamento criado especialmente para assessorar a modelagem de privatizações estaduais.
As condições do empréstimo são vantajosas para os Estados. Minas obteve US$ 250 milhões, o Rio Grande do Sul US$ 60 milhões e o Paraná US$ 120 milhões, a taxas de TJLP mais 8% ao ano.
Minas deu como caução 32% das ações ordinárias nominativas (ON) da Cemig; o Rio Grande do Sul deu 49% das ON. Com base nelas emitiram debêntures conversíveis, que foram adquiridas pelo BNDES.
Privatização com prazo
Os Estados terão seis meses para vender os papéis. A cada seis meses de atraso, vão sendo liberadas parcelas dessas ações para o BNDES, que poderá vendê-las no mercado.
Por enquanto, o único processo efetivo de privatização será com a CRT -a única operadora estatal de telefonia cujo controle não pertence à Telebrás.
Com a ajuda do BNDES, o governo gaúcho definiu um modelo de venda inicial de 20% das ações da companhia a uma operadora privada, que se incumbirá da sua gestão. A mera mudança da forma de gestão ajudará a valorizar os 80% de ações restantes, que serão vendidas mais à frente com lucros maiores.
Se adotada no início do programa de privatização brasileiro, essa prática teria permitido ao Estado apropriar-se da valorização decorrente da privatização da gestão. Ao contrário: toda a valorização acabou sendo apropriada pelos investidores privados, por meio da prática anti-social (desenvolvida pelo próprio BNDES) de vender as empresas pelo valor que teriam se permanecessem estatais. Essa prática só se reverteu parcialmente a partir da privatização da Cosipa, depois de reiterados alertas da coluna.
Partilhando poder
Mesmo em empresas onde a privatização não é iminente -como na Cemig-, a operação permitirá a transição para um sistema de poder partilhado, que impedirá a repetição de operações lesivas ao Estado, como a venda de ações a preços irrisórios para financiar gastos eleitorais.
Na Cemig, um acordo de acionistas garantirá ao BNDES participar de várias decisões que passam a depender de quórum qualificado -como investimentos e alienações de bens acima de determinado valor.
Mesmo que o banco venha mais tarde a se desfazer de suas ações, continuará participando da gestão da companhia.
No caso paranaense, o banco deverá ajudar na modelagem da privatização dos serviços de água e esgoto de Curitiba.
Valores
No caso da Cemig, o governo mineiro permaneceu com 61% das ordinárias. Os 32% estão avaliados em US$ 400 milhões, que correspondem a 32% do valor patrimonial.
Pelos estudos do BNDES, o preço inicial da ação de controle corresponderá a 70% do valor patrimonial. Chegou-se ao número tomando por base a média do valor das ações da Telemig e da Telepar.

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