São Paulo, sexta-feira, 29 de dezembro de 1995
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Sem mágica, com dor

Os efeitos benéficos do Plano Real para os assalariados de baixa renda são indiscutíveis. Segundo cálculos da Fundação Seade, os rendimentos máximos dos 10% mais pobres eram de R$ 113 em dezembro de 94. Em outubro de 95, alcançavam R$ 138. É um crescimento superior à inflação.
Mas a Seade mostra também que os assalariados enfrentaram condições piores no segundo semestre de 1995. Comparando-se com o pico de agosto, de R$ 143, os trabalhadores mais pobres chegaram a outubro com perdas reais.
A explicação é clara: os efeitos da política econômica de contenção foram ganhando força no segundo semestre, para desconsolo de quase todos os setores da indústria e do comércio, que aliás passaram a desempregar. Afinal, não poderia haver mágica que deixasse os trabalhadores fora do ajuste.
Curiosamente, entretanto, por muito tempo se acreditou no Brasil na existência de uma mágica chamada indexação salarial.
Assim, se um setor ia mal, assim mesmo tinha de reajustar seus salários. Resultado: subiam os custos justamente num momento em que seria necessário contê-los.
As chances de quebra da empresa e portanto de maior desemprego aumentavam com a indexação. Para o conjunto dos trabalhadores que ainda mantinham seus empregos, a "mágica" no final das contas mostrava-se incapaz de evitar perdas reais ao longo do tempo.
A desindexação salarial obviamente também não garante a estabilidade do poder aquisitivo dos salários, mas certamente contribui para que os ciclos de ajuste na economia sejam implementados com maior flexibilidade e com menores custos em termos de desemprego.
Está claro que ganhos salariais dependem das condições macroeconômicas e de ganhos de produtividade. A volta ao crescimento econômico com uma melhor distribuição de renda continua urgente.
Crer, porém, que os salários subam quando as empresas se contraem é um contra-senso que só cria mais inflação e desemprego. Se agora a estabilização cobra seu preço, ainda que doloroso, com menor crescimento da renda, ao menos destrói-se a crença numa economia paradisíaca, num passe de mágica.

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