São Paulo, sábado, 30 de dezembro de 1995
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O Banespa e os aeroportos

MÁRCIO FORTES

1995 chega ao fim. O sucesso do Plano Real é inegável. A inflação cai, não exatamente de um mês para o outro, as taxas variam -às vezes sobem, às vezes baixam-, mas sempre que consideramos, a cada mês, o período dos 12 meses anteriores, anualizando a inflação, verificamos a sua queda constante. Esse é o indicador mais importante de uma economia que se organiza, estimulando o investimento e, portanto, o emprego.
Alguns sinais, no entanto, são preocupantes. Nosso crescimento do PIB neste ano ficará em torno de 4%, quando pensávamos, há alguns meses, que pudesse chegar a 6%. Essa diferença de 2% do PIB não é desprezível, sabendo-se que a população cresce a uma taxa próxima de 1,5% ao ano. Traduzida em dinheiro, significa muitos recursos, que seriam suficientes para minorar ou até eliminar alguns dos grandes males sociais do Brasil.
Constata-se também, aqui e ali, que o governo é levado a atender a pequenos incêndios localizados, ora estimulando taxas de juros subsidiadas, ora adiando recolhimento de impostos, ora facilitando a rolagem de dívidas de Estados e municípios.
Embora esse também seja um fator de preocupação, devemos relevá-lo, porque a administração de uma economia como a brasileira, com todas as suas características, tem de ser, em grande parte, enfrentada no dia-a-dia, por causa das inúmeras dificuldades que vão surgindo no caminho.
Entretanto, há motivos para preocupação quando se percebem alguns sinais de fragilidade governamental. Não me refiro exatamente aos casos localizados, como Sivam, pasta cor-de-rosa ou relações do Congresso com o Executivo que, muitas vezes, são alardeados com mais importância do que efetivamente têm -ao menos em suas consequências econômicas.
Refiro-me aos sinais de fragilidade que começam com a solução para o caso Banespa. Com todo o respeito às autoridades de São e Paulo e do Banco Central que aprovaram a solução, tenho a convicção de que o problema do Banespa não se resolve com correção contábil.
A título de comparação, seria simples pensar que a dívida do Estado do Rio com o Banerj -de resto, muitíssimo menor do que a do Estado de São Paulo com o Banespa- se solucionaria se déssemos ao Banerj, por exemplo, o estádio do Maracanã ou o Teatro Municipal, como bens imóveis de grande valor e grandes instalações.
Como exercício, podemos calcular o preço do Teatro Municipal, um edifício do começo do século em plena avenida Rio Branco, de alto valor artístico e histórico.
Quanto valeria para efeitos contábeis, considerando a dívida do governo estadual com o Banerj? Muito. Mas quanto valeria para efeitos práticos, no sentido de devolver ao Banerj sua capacidade de operar, de ter recursos para investir, de poder cobrar juros, de se adaptar à administração bancária moderna e, portanto, ter condições de enfrentar ombro a ombro a concorrência, que é acirrada? Zero.
Assim também ocorre com os aeroportos de São Paulo. Seria cômico, se não fosse trágico. Aeroportos que são operados pelo governo federal, só contabilmente propriedades do governo de São Paulo, serão agora envolvidos -seja como propriedade do Banco Central, seja como propriedade do Banespa- numa solução apenas contábil de salvação do banco.
A recuperação do Banespa não se dará por esses meios. A forma de fazê-lo voltar a ser útil ao povo de São Paulo e à economia brasileira é proporcionar-lhe condições de capitalização em espécie, para que aquela unidade bancária possa emprestar recursos de forma moderna e administrativamente consiga equipar-se cada vez melhor.
E, por último, possibilitar-lhe independência administrativa para adequar sua dimensão ao tamanho de seus negócios. Ou seja, o Banespa tem de reduzir os seus custos, o que inclui uma revisão da situação em que se encontra o seu quadro funcional.
A questão que se coloca é a seguinte: a operação do banco em mãos do governo do Estado, com todos os condicionamentos políticos envolvidos, será veloz e competente para fazer o que é preciso? É de se temer que o Banespa apresente, no fim de 96, os mesmos sintomas que tornaram imperiosa a intervenção que sofreu, ainda que seu principal devedor não seja mais o Estado de São Paulo.
Em paralelo, o governador Marcello Alencar dá um exemplo, decidindo a situação do Banerj de forma adulta, responsável e planejada. Não se está privatizando o Banerj ainda. O primeiro passo foi a escolha de uma organização por concorrência pública -o que acaba de acontecer- que não apenas exercerá a administração do banco, mas terá ao seu encargo adequá-lo à atividade bancária moderna, preparando-o para a sua privatização, o que ocorrerá daqui a um ano.

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