São Paulo, quinta-feira, 9 de fevereiro de 1995
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FHC se rende à 'barganha' com partidos

JOSIAS DE SOUZA; GILBERTO DIMENSTEIN

Presidente elogia PFL e PT, tem restrições a seu partido (PSDB), vê futuro incerto para PDT e critica PMDB
JOSIAS DE SOUZA
Diretor-executivo da Sucursal de Brasília
GILBERTO DIMENSTEIN
Diretor da Sucursal de Brasília
Fernando Henrique Cardoso, 63, está convencido de que, para conseguir aprovar as reformas constitucionais, terá de "barganhar" com os partidos políticos. O vocábulo, de tom pejorativo, é utilizado pelo próprio presidente.
Em seus diálogos reservados, ele demonstra certa resignação diante da realidade: "Há dois tipos de partidos", afirma. "Os mais ideológicos, presentes sobretudo na Europa, e os voltados para a barganha, como os partidos Democrata e Republicano, nos Estados Unidos".
"No Brasil", conclui Fernando Henrique, há um misto de ideologia e barganha, com maior incidência do segundo ingrediente". Trata-se, na sua opinião, de um dado que precisa ser considerado por qualquer presidente que deseje manter com o Congresso um relacionamento produtivo.
É nesse contexto que Fernando Henrique inclui a sanção ao projeto de anistia do senador Humberto Lucena (PMDB-PB). "Se vetasse a anistia, eu brigaria com meio Congresso", disse a dois interlocutores, na última terça-feira. Ele define sua posição no caso Lucena como uma "opção responsável".
Segundo o raciocínio que desenvolve, sua caneta não será conduzida pelos humores momentâneos da opinião pública. Deseja ser julgado não por um ou outro ato isolado, mas pelo trabalho que fará em quatro anos.
Ainda com respeito à barganha política, o presidente não admite que se diga que sua administração é igual às anteriores. Afirma que, no seu caso, a negociação se dará em novas bases.
Acha que, como presidente, deve trabalhar pela solidificação do quadro partidário. Assim, promete "institucionalizar" o diálogo com os partidos.
Ele próprio explica o que vem a ser essa institucionalização: "Nossos contatos serão feitos com os presidentes e com os líderes dos partidos na Câmara e no Senado". O que se pretende, em outras palavras, é pôr em segundo plano os pedidos feitos individualmente.
A fórmula de Fernando Henrique desconsidera dois fatos. O primeiro: no Brasil, nem sempre os presidentes e líderes de partidos falam por seus pares. Luiz Henrique (SC), por exemplo, presidente do PMDB, legenda majoritária no Congresso, fala sozinho.
O segundo fato: não é preciso deter um cargo formal na estrutura partidária para mandar numa legenda. O senador Antônio Carlos Magalhães (BA) é o melhor exemplo. O presidente do PFL é Jorge Bornhausen. O líder na Câmara é Inocêncio Oliveira. No Senado, a liderança é exercida por Hugo Napoleão. Mas nenhum dos três dá um pio sem ouvir ACM.
Sem mencionar o nome de Luiz Henrique ou o de ACM, Fernando Henrique reconhece a falta de representatividade das pessoas que elegeu como interlocutores oficiais e o excesso de autoridade de outros que gostaria de enquadrar nas novas regras. Ainda assim, pretende manter sua estratégia original.
Na visão do presidente, a consolidação dos partidos "está apenas no início" e consumirá "mais de uma década". Mas é preciso que seja impulsionada. Está decidido a servir de mola propulsora desse processo.
Ao analisar a consistência das atuais legendas, Fernando Henrique derrama-se em elogios ao PFL, queixa-se do seu PSDB e toma-se de preocupações ao referir-se ao PMDB.
No lado oposicionista, considera o PT uma legenda sólida —"Não tenho qualquer dificuldade em dialogar com eles"—, mas não pensa o mesmo do PDT —"Tenho muitas dúvidas quanto ao futuro do partido".
Os elogios ao PFL devem-se ao que Fernando Henrique chama de "coerência de propósitos" do partido, na sua opinião o único que sabe exatamente o que deseja. Ele acha ainda que os pefelistas são hoje, por questão de sobrevivência, "menos fisiológicos".
O presidente não enxerga a mesma objetividade no PSDB. "Há uma ala mais à esquerda", diz. Mas não crê que o partido vá lhe criar problemas no Congresso.
Quanto ao PMDB, Fernando Henrique o vê como um partido fragmentado, sem comando definido e excessivamente vinculado a interesses clientelistas. Nesta semana, veiculou-se a informação de que o partido teria preparado uma lista de indicações para cargos no segundo escalão do governo.
O líder peemedebista na Câmara, Michel Temer (SP), telefonou para o Planalto. Disse ao presidente que a informação era improcedente. "Ele pode até não estar preparando, mas alguém no partido está", diz FHC, em diálogos mantidos em seu gabinete.

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