São Paulo, sexta-feira, 10 de fevereiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Berlim celebra centenário de Buster Keaton

AMIR LABAKI
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

As comemorações do centenário do cinema ultrapassam as fronteiras da pátria dos Lumière e transferem-se provisoriamente a partir de hoje para o passado de Max Skladanowsky (1863-1939), pioneiro do cinema alemão (leia texto ao lado).
O 45º Festival Internacional de Cinema de Berlim inaugura em seu segundo dia a grande mostra do ano, "Happy Birthday, Cinema! - 100 Anos de Cinema, Comédia, Keaton".
Buster Keaton é o personagem de Berlim-95. A coincidência de efemérides, completando-se em outubro também o centenário do nascimento do ator, tornou-o um oportuno símbolo. Berlim escolheu homenagear o cinema através de seu gênero mais popular, e Keaton representa como ninguém o papel do gênio da comédia.
No panteão do gênero, só ele disputa as preferências com Chaplin. A chave da comédia keatoniana é o contraste entre a aparente passividade de seu personagem fílmico ("o homem da cara de pedra", "o homem que nunca ri") e o turbilhão a que jamais se nega a intensamente enfrentar.
Filho de um casal de cômicos ambulantes, Joseph Frankis Keaton tornou-se Buster muito cedo, estreando em cena aos 3 anos. "Fui um garoto descabelado criado nos bastidores", reconheceria.
O domínio do cinema deveu muito à parceria inicial com Roscoe "Fatty" Arbuckle, Chico Bóia entre nós. Fatty já era um dos reis da comédia quando em 1917 resolveu dar uma chance a Keaton.
Foram 16 daqueles curtas de mocinho e bandido, cachorro e polícia, tortas e tropeções, sete dos quais presentes em Berlim, incluindo o mitológico "A Garagem" (1919). Neste filme, Keaton supera Arbuckle, torna-se o protagonista e pela primeira e única vez no cinema sorri. Era como que um sinal do fim de um ciclo.
O filme seguinte, "The Saphead" (1920), que passa hoje, não é cômico e se destaca apenas por ser o primeiro longa estrelado por Keaton. Ele logo voltaria à comédia curta. O desafio do longa seria vencido três anos depois com "The Three Ages". Começavam os tempos áureos de sua carreira. Seriam dez longas, por ele estrelados, produzidos e quase sempre dirigidos até a revolução do som em fins dos anos 20.
Ao contrário da lenda, o cinema sonoro não liquidou sua carreira, rodando Keaton de 1930 a 1933 oito longas bem recebidos. A decadência veio com a ruptura com o "studio system": Keaton discute com o chefão Louis B. Mayer e é despedido da Metro-Goldwyn-Mayer. Nunca mais se reergueu.
Buster passou a ganhar a vida estrelando comédias breves para Hal Roach. Tentou uma nova dupla com Charles Lamont, aumentou mais do que o devido a dose etílica diária, parou e voltou, no máximo em pontas. Nos anos 40, Buster Keaton já é passado.
Entram os 50 e começam as homenagens. Billy Wilder não o poderia deixar de fora de "Crepúsculo dos Deuses" (1950), Chaplin suaria muito pra ombrear-se a ele numa rápida cena de "Luzes da Ribalta" (1952). Em 1959, ao lhe concederem um Oscar honorário, pedem-lhe um sorriso e ele retruca: "No máximo, você vai ter a minha versão da Mona Lisa".
Em 1965, um ano antes de morrer, Keaton estrelava, a convite de Samuel Beckett, "Film", o único roteiro cinematográfico do dramaturgo. Fechava-se com coerência sua trajetória. Berlim-95 a resgata em 36 curtas e 27 longas, três dos quais em cópias restauradas. Vale o festival.

Texto Anterior: Mudanças na lei serão abrangentes
Próximo Texto: Abertura lembra pioneiros alemães
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.