São Paulo, domingo, 12 de fevereiro de 1995
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Crise cambial argentina vira uma crise bancária

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Embora o assunto do momento seja crise cambial, a crise argentina na semana passada já revela outro roteiro: o câmbio pode até passar bem, ou seja, a desvalorização pode ser evitada. Mas a situação se complica quando ocorre uma espécie de metamorfose e a crise assume as características de uma crise bancária interna.
Na Argentina, veio o próprio presidente da República alertar: depositem em bancos confiáveis! É esdrúxulo um presidente reconhecer publicamente que as instituições, teoricamente sob seus cuidados, têm pilares podres.
É comum supor que os movimentos cambiais carregam informação sobre desequilíbrios econômicos subjacentes.
Os problemas das últimas semanas, entretanto, mostram que há excessiva volatilidade e desalinhamento frequente nos sistemas de preços. Numa economia com câmbio congelado, o resultado é quase mecânico: os desequilíbrios camuflados eclodem ou se transferem para outras instituições.
As políticas cambiais podem ser avaliadas do ponto de vista da estabilização de curto prazo, da disciplina das políticas governamentais e das possibilidades de harmonização de políticas entre países.
No caso argentino, a estabilização no curto prazo e a busca de disciplina fiscal pesaram mais que o conceito de harmonia com o resto do mundo. Na prática, essa harmonia foi pressuposta, face à abundância de capitais externos.
No caso, o regime de plena conversibilidade permite que a fuga de capitais ocorra não para fora do país, mas das instituições frágeis para as sólidas. Ocorre que o limite entre essas áreas não é objetivo, passa por reações de pânico.
Há outro agravante. O próprio governo Menem já injetou dinheiro na economia para defender as instituições mais frágeis, na primeira etapa da crise.
Se o governo agora abandona essas instituições à própria sorte, há também um impacto nas contas públicas (e nos bancos que o governo levou a socorrer os menores). Em suma, separar o joio do trigo em meio ao temporal é inviável. O fenômeno do contágio é típico das crises financeiras.
O impasse agora parece bastante claro: com ou sem ajuste cambial, a economia argentina caminha para uma recessão. A crise externa, ou pelo menos o risco de uma crise cambial, de solvência das obrigações externas do país, pode dar lugar a uma crise bancária e à quebra de empresas.
Se quebram bancos e empresas, naturalmente diminui a capacidade do governo de arrecadar impostos. Exatamente quando esse governo talvez se veja, num período pré-eleitoral, bastante tentado a gastar mais, tentando evitar a quebra de interesses mais próximos ou o aumento explosivo do desemprego.
Menos impostos, mais gastos: sinônimo de déficit fiscal —vai sendo minada justamente a base do câmbio fixo e da conversibilidade. No final, portanto, a crise cambial que quase por alquimia transformara-se em crise bancária e recessão pode reaparecer, novamente sob a forma de crise cambial pura.

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