São Paulo, segunda-feira, 20 de fevereiro de 1995
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Quem tem medo da revisão?

MARIA LÚCIA SÁ M. A. DOS REIS

A questão da revisão da carta política de 1988, de um modo geral, tem sido abordada de forma pouco transparente, dando a entender que o Brasil se tornará inviável caso não haja reforma integral da constituição de 1988. Obviamente, alguns temas necessitam ser revistos como o sistema tributário nacional e o tratamento discriminatório do capital estrangeiro. Outros não têm absolutamente nada a ver com a propalada modernização defendida pelos neoliberais tupiniquins, como a estabilidade do servidor público e a discutível reforma da previdência.
Contrariamente ao que se divulga, a estabilidade do servidor público é assunto alheio à privatização e não trará nenhuma economia para o governo a curto ou médio prazo, porque só diz respeito aos servidores da administração direta, autárquica e fundacional, e não aos empregados das empresas estatais. Além do mais, qualquer emenda supressiva da estabilidade somente poderá ser aplicada em relação a pessoas que ingressarem no serviço público, a partir da referida emenda, uma vez que o direito adquirido é cláusula pétrea da constituição e, assim, os servidores, que já adquiriram o direito à estabilidade, não poderão ser demitidos.
Quanto à previdência do servidor público, a discussão sobre o tema, tão pouco, é conduzida com base em dados reais, pois tenta-se divulgar a imagem de que há um tratamento desigual entre os servidores públicos, que têm direito à aposentadoria integral, e os trabalhadores da iniciativa privada, que não gozam dessa vantagem. Todavia, não se informa que o trabalhador da iniciativa privada paga uma contribuição previdenciária, com piso máximo, de 9,5% sobre dez salários mínimos, cujo valor não chega a atingir R$ 70,00. Já os servidores públicos são descontados em 12% de sua remuneração bruta e chegam a pagar cerca de R$ 700,00, a título de contribuição para a aposentadoria, o que, vamos e venhamos, representa uma brutal diferença.
Por fim, cabe a indagação. Por que a previdência haveria de falir se não for aprovado o fim da aposentadoria integral dos servidores públicos? É uma questão para a qual não encontramos resposta, porque afinal o que é feito do PIS/PASEP, da contribuição social sobre o lucro das empresas, do FINSOCIAL e da contribuição previdenciária? Se a previdência corre o risco de falir, se o salário mínimo for aumentado e se a aposentadoria integral ou por tempo de serviço não for suprimida, para onde vão todas essas receitas? É algo que merece reflexão antes que o Congresso embarque nessa canoa furada na presidência.

MARIA LÚCIA SÁ MOTTA AMÉRICO DOS REIS, 55, é presidente do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional.

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