São Paulo, quinta-feira, 2 de março de 1995
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Chile só entra no Mercosul com privilégios

FERNANDO RODRIGUES
ENVIADO ESPECIAL A SANTIAGO (CHILE)

O Chile quer entrar no Mercosul mas exige um tratamento privilegiado para isso. A viagem ao país vizinho que o presidente Fernando Henrique começaria às 23h de ontem dificilmente reverterá essa posição.
Essa informação foi coletada pela Folha junto a autoridades econômicas e financeiras chilenas.
"O presidente Eduardo Frei nos disse que tem o desejo político de integrar o Chile ao Mercosul. Nós estamos tentando inventar uma forma, mas é difícil. Não é algo para já", disse o embaixador Juan Salazar, diretor-geral de Relações Econômicas Internacionais do Ministério das Relações Exteriores chileno.
Salazar é o homem do Mercosul no governo chileno. Ele resumiu o que Chile espera dos países do Mercosul: "Uma liberação dos investimentos estrangeiros e mais mercado para nossos produtos."
O Mercosul inclui Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai numa associação aduaneira desde o dia 1º de janeiro. O objetivo futuro é a total integração comercial, econômica e monetária.
No princípio, o Chile não teve interesse. "Nossa economia poderia ser contaminada pela instabilidade do Brasil e da Argentina", afirmou Salazar.
Hoje, com a inflação baixa no Brasil e na Argentina, o Chile passou a ter mais interesse. Só que não deseja abrir mão das suas políticas econômicas e comerciais.
Por exemplo, o Chile tem uma tarifa de importação fixa de 11% para quase todos os produtos. As exceções são alguns tipos de automóveis de luxo e bebidas.
Os países do Mercosul têm tarifas de importação de até 30%. Em alguns casos, superam essa porcentagem. Em tese, para entrar na associação, os chilenos teriam de aumentar suas tarifas. Para o embaixador Salazar, "isso seria inaceitável".
Se não quer adequar suas alíquotas de importação, o que teria o Chile a oferecer ao Mercosul? Salazar responde com uma divagação sobre a oferta chilena.
"Temos nosso mercado, que não é muito grande. Nossa posição geográfica oferece uma saída para o Pacífico e temos tradição de comerciantes. Queremos colocar os produtos do Mercosul em outros países. Podemos ser a Hong Kong ou a Cingapura da América Latina."
O mercado chileno é pequeno se comparado aos do Brasil e Argentina. Há 13,8 milhões de habitantes no Chile. Menos de 10% da população brasileira. E cerca de 40% da argentina.
Apesar da relutância chilena, as negociações entre o país e o Mercosul estão em curso há cerca de seis meses. A próxima reunião técnica está marcada para a primeira quinzena de abril.
Mesmo os maiores defensores da associação —exportadores— são contra uma adesão clássica.
"Estamos muito interessados. Seria um ótimo mercado. Mas o Chile não pode aumentar suas alíquotas", disse o presidente da Associação dos Exportadores de Produtos Manufaturados do Chile, Roberto Fantuzzi.
Para o ex-presidente do Banco Central do Chile Andres Bianchi, o país vê hoje o Brasil com "otimismo cauteloso". No caso da Argentina, há "apreensão".
Bianchi é uma respeitada autoridade na área econômica. Na sua avaliação, outro objetivo que está longe no horizonte é a unificação nas políticas monetárias.
"O Brasil apenas começa. A Argentina passa hoje por uma situação de câmbio fixo que enfrentamos há quase 15 anos. Nosso sistema é muito mais sofisticado."

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