São Paulo, domingo, 5 de março de 1995
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Líder do PMDB exige mais cargos federais

CARLOS EDUARDO ALVES
DA REPORTAGEM LOCAL

Líder do PMDB na Câmara, o deputado paulista Michel Temer, 54, não esconde que o seu partido quer mais cargos no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Advogado e procurador do Estado, Temer tem em seu currículo passagens pelos governos estaduais de Franco Montoro (83-87) e Luiz Antonio Fleury Filho (91-94), além de uma convivência amistosa com Orestes Quércia.
Nesta entrevista exclusiva à Folha, o deputado diz, entre outros pontos, que, pelo critério de proporcionalidade, o PMDB deveria ter um espaço maior no governo FHC. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Folha - Como o sr. vê a disputa que os ex-governadores Orestes Quércia e Luiz Antonio Fleury Filho travam hoje pelo controle do PMDB paulista?
Michel Temer - É inegável que há uma disputa forte, mas o PMDB não pode se dar ao luxo dessa divisão. Espero que a disputa fique apenas no plano eleitoral, e não no pessoal.
Vejo essa conflagração com preocupação. Vou procurar, como deputado e líder da bancada, tentar conduzir essa conflagração para a revitalização do partido.
Folha - Esse embate entre Quércia e Fleury pode ser perigosa para o PMDB nacional?
Temer - Eu acho que pode ter reflexos. A nossa tarefa, de Quércia e Fleury, é evitar essa conflagração. Se o ressentimento ficar apenas na área política, e não na pessoal, a unidade será possível.
Folha - No plano nacional, quem é hoje o líder do PMDB?
Temer - Existe hoje a coletivização da liderança. Não há mais lideranças individuais no PMDB. Há nomes de prestígio, mas o sentimento é de uma coletivização dessas lideranças.
Folha - Então, acabou a hegemonia de Quércia no PMDB?
Temer - Não diria isso. Orestes Quércia é um dos líderes do PMDB, mas a ele se somará esse sentimento de liderança coletiva.
Folha - Que papel o sr. vê para o ex-governador Fleury nesse processo?
Temer - Ele é ex-governador de São Paulo e tem um papel importante como tal. Tudo vai depender da sua atuação nas eleições dos diretórios municipais e do diretório estadual. Espero, como disse antes, que seja uma atuação com vistas à unidade do partido.
Folha - Fleury não está desgastado pela revelação do estado caótico das finanças do governo de São Paulo?
Temer - Vou apenas dizer que o poder é extremamente desgastante. Fleury teve acertos e erros, e hoje seus erros é que são mais revelados. A política é dinâmica, mas não ignoro que hoje houve um desgaste do ex-governador.
Folha - O senador José Sarney tem conseguido vitórias importantes dentro do PMDB. Ele não é o novo dono do partido?
Temer - Ele é uma figura muito importante. Basta dizer que no momento ele preside o Congresso Nacional. É um dos poderes da República. Portanto, o ex-presidente Sarney hoje governa, como chefe que é do Poder Legislativo.
Folha - O PMDB ainda é o maior partido do país, mas atualmente é uma configuração de nomes muitas vezes antagônicos. O sr. vê futuro na unidade do partido?
Temer - A unidade não é impossível. É que as feridas do PMDB estão mais escancaradas que em outros partidos. Tudo dependerá da pregação de seus líderes e da coletivização das lideranças no PMDB.
Folha - O PMDB precisaria hoje de uma definição ideológica maior para manter-se unido ou como grande partido?
Temer - Todas as conquistas democráticas do país, nos últimos anos, passaram pelo PMDB. O partido sempre teve bandeiras e por isso hoje tem discurso.
Mas não tenho dúvidas de que o PMDB precisa de novas bandeiras que o identifiquem perante o povo. Essas bandeiras surgirão muito possivelmente durante a reforma constitucional.
Hoje as preocupações ideológicas estão num plano subsidiário. O que interessa ao cidadão é o pão que está sobre sua mesa, o ganho que ele tem por mês, a segurança etc. O que interessa hoje é um partido de resultados, no lugar de desfraldar bandeiras ideológicas.
Folha - O que diferencia hoje PMDB e PSDB?
Temer - É uma pergunta curiosa. Programaticamente não há diferença. Esse é um problema dos partidos políticos. Fora uma ou outra diferença político-partidária ou quase político-pessoal, não haveria dificuldades para um inter-relacionamento mais próximo, gerando até uma mesma sigla.
Não acho que seja fácil de acontecer, mas acho possível em face de uma colocação doutrinária.
Folha - Como o sr. vê a relação do PMDB com o governo Fernando Henrique Cardoso?
Temer - É uma relação de harmonia. O PMDB resolveu apoiar oficialmente o governo. O primeiro passo foi a escolha dos ministros, e nesse particular três ministérios foram reservados ao PMDB.
O PMDB está no governo pelos ministérios e mais ainda porque tem participado das decisões políticas do governo.
Folha - O PMDB está satisfeito com os cargos e o espaço político que tem hoje no governo?
Temer - A única coisa que o PMDB pleiteia é o mesmo espaço destinado aos demais partidos aliados, e o presidente Fernando Henrique tem divulgado que dará aos partidos aliados igual espaço.
E é fundamental esse espaço porque, se os partidos aliados estão comprometidos com o programa do governo, é importante que os seus membros tenham presença na execução desses programas, e isso significa estar no Executivo.
Folha - O sr. acha que a cota do PMDB já está preenchida no segundo e no terceiro escalões?
Temer - O presidente da República cuidará disso agora.
Folha - O PMDB tem reivindicações a fazer para o segundo e o terceiro escalões?
Temer - Como qualquer outro partido. Há muito espaço. Não há no PMDB fome por cargos. Haverá sim preocupação com as teses que o governo está mandando para o Congresso Nacional.
Folha - Então o PMDB abriria mão de cargos?
Temer - Não. Significa simplesmente que ele não será o provocador desses cargos. O que ele fará será oferecer nomes qualificados profissionalmente para avaliação do presidente da República.
Folha - O sr. acha que tem de prevalecer como critério o fato de o PMDB ser o maior partido entre os que dão sustentação ao presidente da República?
Temer - A Constituição brasileira assegura em todas as suas passagens políticas o critério da proporcionalidade. Portanto, em tese, se for aplicado o critério constitucional da proporcionalidade, é claro que o PMDB deveria ter um espaço político maior.
Folha - O sr. acha que o governo está sabendo negociar politicamente com os partidos?
Temer - Ele está levando com muita cautela o tratamento com os partidos. O presidente Fernando Henrique não leva uma matéria ao Congresso sem antes dialogar com as lideranças dos partidos aliados.
O que é preciso é fazer uma boa articulação na Câmara e no Senado, e isso há de ser feito pelos líderes do governo.
Folha - Onde o governo Fernando Henrique mais acertou e mais errou até agora?
Temer - O governo Fernando Henrique é muito participativo, o que será seu traço peculiarizador.
Aí acho que é um governo que está acertando muito. Se eu quisesse dizer de um eventual equívoco do governo, diria que ele não está sendo ainda agressivo como convém a um governo.
Mas essa falta de agressividade significa uma cautela que nesse momento é saudável.
Folha - Agressivo em que temas, por exemplo?
Temer - Junto ao Congresso. No caso da minirreforma tributária que o governo enviou por meio de medidas provisórias logo na abertura dos trabalhos legislativos, achei que faltou ao governo uma certa agressividade perante o Congresso.
Tanto que o secretário da Receita compareceu ao Congresso e, numa reunião com líderes, acordou uma nova MP que praticamente, naquele momento, reduzia o alcance da MP inicial. É uma cautela excessiva.
Folha - Como o sr. avalia as propostas do governo para a reforma constitucional?
Temer - Por enquanto, acho razoáveis. Estão muito bem redigidas, concisas e objetivas. Mesmo numa questão fundamental como o monopólio do petróleo, por exemplo, a redação da emenda constitucional é muito hábil.
Ela mantém o monopólio e confere à União uma faculdade chamada discricionária. Dá à União a faculdade de contratar com particulares ou não contratar e ainda diz a emenda sob condições que a lei estabelecer, ou seja, sob condições que o Congresso vai impor.
Folha - Do que foi apresentado até agora, o PMDB discorda de algum ponto?
Temer - Especificamente, de nenhum. O que há é uma atitude isolada de membros do PMDB que têm compromissos históricos com certas teses.
O deputado Paes de Andrade ex-presidente da Câmara, me disse que tem compromisso histórico com o monopólio e não pode voltar a favor de outra tese. Não há como evitar objeções de natureza individual.
Folha - Na questão do monopólio já dá para vislumbrar qual será a posição majoritária no PMDB?
Temer - Eu acho, como palpite, que será favorável à flexibilização do monopólio, dentro da proposta do governo.
Folha - O sr. vê necessidade de alguma correção no Plano Real?
Temer - Eu vejo as necessidades que o governo tem apontado. A história da contenção do consumo, ou seja, a redução do número de prestações nas mais variadas hipóteses. Se é para manter o real, será extremamente útil para o país.
Folha - O PMDB aceitou o veto ao salário mínimo de R$ 100?
Temer - O PMDB aprovou o salário mínimo na Câmara na convicção de que o valor atual do salário mínimo não é suficiente para manter o trabalhador e sua família. Mas o governo diz que isso quebra a Previdência Social.
Em face das razões do veto é preciso que o Congresso medite maduramente sobre as razões desse veto. Mas anseia-se que o governo forneça uma alernativa para que o trabalhador possa ter os R$ 100 sem atingir a Previdência.

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