São Paulo, segunda-feira, 6 de março de 1995
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Câmbio e intervencionismo

IGOR CORNELSEN

Muitas análises sobre a crise do México e suas repercussões no Brasil têm sido publicadas, como a do articulista da Folha de São Paulo, sr. Demian Fiocca que, com clareza e objetividade apresentou sob o título "Não basta o ajuste do setor público", sugerindo que o equilíbrio macroeconômico não é somente função do equilíbrio das contas públicas mas também da taxa de câmbio.
O articulista não teve informação entretanto de que o México mudou a contabilização de empréstimos de seu banco de desenvolvimento, a fim de que a expansão de seus empréstimos não viesse a se constituir em déficit público. Se tivesse mantido os mesmos critérios anteriores, o déficit público teria voltado contabilmente em 93 e teria alcançado 4,7% do PIB em 94. Mas independente de ter ou não este déficit público, o México teria ido à insolvência externa.
Não há como discordar da análise de Demian Fiocca, também acredito que artificialismos na taxa de câmbio levam a distorções em toda a economia. Prefiro entretanto tentar adivinhar o futuro imediato do Plano Real e da taxa de câmbio em função da crise do México.
O Brasil, na minha opinião, não corre o risco de falir como o México. De setembro em diante, o Banco Central já gastou US$ 7 bilhões de suas reservas para pagar compromissos do Tesouro junto ao BID, Banco Mundial, FMI, Clube de Paris, vendeu diretamente dólares ao Banco do Brasil para este fornecer recursos à Telesp e à Petrobrás para resgatarem os seus eurobônus, adiantou recursos ao Banespa para pagar compromissos externos, etc. Se todos estes pagamentos fossem feitos com dólares adquiridos no mercado, ao invés de no Banco Central, a taxa de câmbio não seria mais de R$ 0,85 por dólar, mas outra qualquer.
O intervencionismo do Banco Central, entretanto, tem um claro limite, que é a velocidade de queda do nível das reservas. O insucesso do intervencionismo no câmbio no México, tornou os mercados de capitais internacionais espertos, para não mais financiarem políticas irrealistas de câmbio, como lá o fizeram.
A partir de agora, a balança comercial e a de contas corrente é o que determinará o nível de confiança dos investidores internacionais. A ênfase nesta abordagem será tão ou mais importante que o déficit público ou o nível da inflação interna.
Analistas internacionais estão sempre tentando adivinhar qual deveria ser a taxa efetiva de conversão do real em dólares, para que se tenha a estabilidade macroeconômica a longo prazo. Creio que só o mercado pode estabelecer um preço justo para o real, de tal forma que se atraia capital para investimento produtivo e não se estimule a compra de bens de consumo importados, que se tornaram baratos em real, através do subsídio implícito ao consumo de importados, com a manutenção artificial da taxa de câmbio de R$ 0,85 por dólar, facilitada pela venda de reservas do Bacen diretamente a Bancos públicos, ou no pagamento de compromissos do Tesouro no exterior, sem que estes estejam obrigados a adquirir os dólares no mercado de câmbio.
Não se deve exagerar a preocupação com a volta da inflação. Desde que o Banco Central mantenha o controle sobre os agregados monetários e os salários não estejam indexados o impacto inflacionário é mínimo como o provaram as desvalorizações na Inglaterra, França, Espanha, entre outros.
Estou convencido que antes de julho teremos o câmbio definido pelo mercado no Brasil, mesmo que falte vontade política para mudá-lo. Vai ser alterado por falta de financiadores externos.

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