São Paulo, segunda-feira, 6 de março de 1995
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EUA tendem a isolacionismo com republicanos

PAUL A. SAMUELSON

Os jornais estrangeiros que pedem minhas opiniões sobre a economia mundial às vezes fazem perguntas específicas.
Nos últimos três meses, desde a conquista do Senado e da Câmara dos EUA pelos republicanos, a seguinte pergunta me foi formulada repetidas vezes: O que a vitória republicana significa para mim na Espanha (ou na Itália, na Coréia do Sul, no Japão etc.)?
Minhas primeiras respostas foram as seguintes:
1. O movimento político contrário a Clinton e ao liberalismo democrata deve ser levado a sério. A julgar pelas evidências disponíveis até o momento, tudo indica que Clinton não será reeleito em 1996. Sua derrota ou sua retirada do páreo não é certa, mas deve ser calculada no momento como uma probabilidade de 65%.
2. É provável que as forças dominantes no Partido Republicano se tornem cada vez mais isolacionistas. Estados Unidos em primeiro lugar. Gastemos para ampliar as capacidades militares, mas afastemo-nos do altruísmo e da cooperação internacionais.
Infelizmente, as batalhas legislativas no Congresso movidas recentemente pelo presidente da Câmara, Newt Gingrich, e pelo líder da maioria no Senado, Robert Dole, confirmaram meu pessimismo.
Quando o presidente Clinton foi confrontado com a desvalorização mexicana e a consequente queda livre do peso e da Bolsa de Valores do México, ele temeu que isso pudesse se espalhar para outros mercados emergentes.
Como podem atestar argentinos, malasianos e outros, seus mercados realmente caíram em consequência da crise mexicana.
Como o México fica tão perto de nós e de nossas exportações, e nossos problemas de imigração estão tão intimamente ligados à boa saúde econômica desse país, o presidente Clinton pediu ao Congresso que autorizasse um fundo de socorro de US$ 40 bilhões.
De início, Dole e Gingrich expressaram sua concordância. Mas a nova maioria republicana afirmou perceber uma objeção nas bases conservadoras a qualquer socorro emergencial a estrangeiros.
No fim, o presidente foi obrigado a recorrer a seus poderes executivos e a implementar um pacote assistencial de US$ 20 bilhões, financiado por suas limitadas reservas de equalização cambial.
Esse exercício de liderança presidencial implica riscos para Clinton. Se as coisas forem mal no México, o Congresso e o eleitorado vão atribuir a culpa a ele.
Ainda pior: os novos republicanos estão engajados em um esforço resoluto para restringir os poderes efetivos da Presidência.
Eles se propõem a destituir Clinton de seus poderes de enviar tropas para o exterior sem a explícita autorização prévia do Congresso. Isso é diferente do que Woodrow Wilson pôde fazer em 1917, ou do que Franklin Roosevelt pôde fazer em 1939-41.
Mesmo presidentes republicanos, como Ronald Reagan e George Bush, não teriam podido fazer o que fizeram em Granada, Líbia, Panamá e Iraque sob as regras de jogo que estão sendo propostas.
Japão e Coréia do Sul vão perceber que, no caso de um confronto com uma Coréia do Norte nuclearizada, os EUA terão se tornado um parceiro menos confiável, na medida em que apresentam uma tendência ao isolacionismo.
E se a Índia vier a correr perigo às mãos do Paquistão ou da China, também não poderá contar muito com uma América isolacionista.
As iniciativas republicanas no sentido de proibir que soldados americanos sejam subordinados a comandantes estrangeiros ou da ONU não levam a qualquer resultado útil. Pode-se imaginar o que isto significaria para a Otan.
Ou para a ONU. A cruzada de George Bush contra o Iraque e em defesa do Kuait foi barata, em vidas e custos, exatamente porque o manto da ONU convenceu outras grandes potências a juntar-se aos EUA na Guerra do Golfo.
Se os norte-americanos não participarem de um comando conjunto, como se pode esperar que aliados deixem um general Eisenhower exercer uma liderança unificada em qualquer operação futura de manutenção da paz?
Os grilhões com que o Congresso pode vir a sujeitar um Clinton em final de mandato, sem perspectivas de reeleição, vão terminar por privar um futuro presidente republicano de nossa tradicional divisão de poderes entre Legislativo, Judiciário e Executivo.
Escrevo sobre Partido Republicano versus Partido Democrata. Mas o que estamos testemunhando nos anos 90 é uma crescente desconfiança, entre os cidadãos norte-americanos, em relação a direitos e poderes governamentais. Vivemos uma revolução libertária, uma tendência ao anarquismo.
No século passado, na fronteira oeste dos EUA, onde agricultores autônomos viviam principalmente do que seus próprios ranchos produziam, o anarquismo era uma ameaça relativamente pequena.
No mundo de hoje, um sistema federalizado em que 50 Estados recebem porcentagem cada vez maior da receita tributária total, essa tendência ameaça o papel dos EUA enquanto potência mundial e como sociedade capaz de defender seus próprios interesses contra quaisquer agressões estrangeiras que possam surgir no século 21.
É claro que qualquer democracia apresenta oscilações em suas tendências. É possível que os atuais programas ingênuos e excessivos levem a desencanto popular com Gingrich e a direita cristã. Mas, na melhor das hipóteses, acho que a situação deve piorar antes de começar a melhorar.

Tradução de Clara Allain

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