São Paulo, terça-feira, 7 de março de 1995
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Godfrey Reggio dirige fábrica de criação

LEON CAKOFF
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE TREVISO

Eu não estou interessado em currículos. Quero formar um grupo criativo de provocação

O futuro do cinema, e de muitas outras artes, pode estar em Treviso (Itália), sede do império Benetton, num projeto batizado como Fabrica. O bem-sucedido empresário Luciano Benetton, 52, está despejando alguns milhões de dólares com a expectativa de revelar novos e jovens talentos artísticos a partir dos próximos meses.
A sede da Fabrica é um palácio veneziano do século 17, em Castratte di Treviso (20 km de Veneza, Itália). Para dirigir o ambicioso projeto, Benetton e Oliviero Toscani, 52, seu diretor de criação publicitária, chamaram o cineasta norte-americano Godfrey Reggio, 56, diretor dos longas "Koyanisqatsi" e "Powaaqatsi" e do média "Anima Mundi".
Em entrevista à Folha, Reggio revelou pela primeira vez o que pretende fazer com os jovens talentos que vai selecionar de todo o mundo, inclusive do Brasil, para dar os rumos desta fábrica multirracial de criação.

Folha - Como começou sua relação com Luciano Benetton e Oliviero Toscani?
Godfrey Reggio - Foi no verão de 92, quando participava do International Design Conference no Aspin Institute, na Califórnia, que teve uma apresentação do Toscani. Ele veio me pedir para considerar a possibilidade de ir à Itália para fundar uma escola para Luciano Benetton. Ele me perguntou o que eu achava e eu lhe disse que achava escola uma má idéia.
Eu disse que não estava interessado em trabalhar numa escola e que ele, por favor, deveria pensar em outras pessoas para a tarefa. Ele telefonou para minha casa e falamos de novo sobre o assunto. Depois de várias visitas à Itália, de conhecer o Luciano Benetton, e sentir que a oferta era muito real, eu aceitei.
Oliviero me disse que o jeito que eu faço os meus filmes é o jeito que eles querem que a escola seja feita. Eu não estou interessado em estruturas, currículos, professores, nenhum tipo de universitário pensando em bolsas tradicionais, classes. O que eu quero é formar um grupo criativo de provocação. E quando ele disse porque você não faz a escola como você faz os seus filmes ele me deu a pista para entender como eu poderia criar esta escola.

Folha - Que tipo de gente você está procurando para a escola?
Reggio - Aquele que tem uma voz criativa capaz de interferir na mídia, gente capaz de se deixar absorver e capaz de esquecer o seu eixo de referência, mas sem se perder.
Folha - E o que você espera desses seus "estudantes"?
Reggio - Com este empreendimento tenho um sentimento de que estou indo para um lugar que não sabemos onde vai dar, uma jornada rumo ao desconhecido. Quem vier à escola não será um estudante. Será um colega ou colaborador.
Folha - E quanto tempo vai levar para se apresentar a primeira criação da Fabrica?
Reggio - Por volta de setembro de 95 vamos ter a primeira manifestação que virá em forma de campanha mundial para apresentar a Fabrica. Vamos ter uma gigantesca campanha na imprensa, rádios e TVs, talvez em 50 ou 60 países. E isto tudo está para acontecer muito depressa.
Folha - Quem está vindo do Brasil?
Reggio - Não sei ainda. Tenho tantas possibilidades do Brasil que ainda estou estudando com muito interesse. Estou muito próximo dos nomes. O Brasil, de todos os mais longínquos países em que fomos buscar gente, é o lugar mais promissor em talentos.
Folha - Existe a possibilidade de um grande estúdio americano abraçar o projeto?
Reggio - É verdade, mas estou neste momento no meio das negociações. Toscani e Benetton estão sabendo das negociações e todos nós estamos esperando para ver o que pode acontecer.
Folha - Você acredita que é possível colocar todos os "estudantes" trabalhando juntos?
Reggio - Todos estarão aqui fazendo algo que nunca fizeram antes. Certamente teremos muitos projetos diferentes, mas no fim todos eles parecerão um único: muitas vozes, uma forma. Esta é a intenção.
Folha - O objetivo da Fabrica também será provocar?
Reggio - Esta é a intenção. Temos alguma coisa que nos coloca numa zona privilegiada. É um privilégio poder pensar insanamente. Ao mesmo tempo temos uma responsabilidade muito grande porque estamos ingressando na possibilidade das consequências. A arte tem que dar conta da sua própria responsabilidade.

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