São Paulo, terça-feira, 7 de março de 1995
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Caiu na real

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA — Num lamento com assessores, o presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou ter sido "ultrapassado pelos fatos", o que o obrigou a mudar de discurso sobre a taxa de câmbio. A novidade produz sérias implicações políticas.
Ele jogou gravetos na fogueira baixa da inflação, ao desvalorizar da taxa de câmbio. A tradução política é a perspectiva óbvia de desgaste em seu prestígio.
Apesar das previsíveis negativas oficiais, técnicos graduados do Ministério da Fazenda reconhecem, reservadamente, que o aumento do custo das importações pressiona o preços aqui dentro.
Qual o impacto não se sabe —e, muito menos, o impacto psicológico no homem comum, viciado há décadas na ciranda dos preços. Vai subir o combustível?
Já existiam indicações de que a inflação seria maior em março, graças, em parte, ao reajuste de mensalidades escolares —isso numa economia ainda com o consumo excitado. A alteração das regras do câmbio apenas estimula esse movimento para cima.
O presidente Fernando Henrique Cardoso mostrava-se disposto a evitar mudanças no câmbio. Não queria mais pressões nos preços, capazes de abalar a confiança em seu governo. Via por trás da gritaria o lobby dos exportadores, articulado com setores políticos, como chegou a dizer a esta coluna.
Ele afirma ter sido ultrapassado pelos fatos porque a crise mexicana começou a ter reflexos mais sérios na Argentina. E seria necessário dar um sinal ao mundo de que o governo brasileiro estava disposto a sacrifícios para manter a entrada de dólares —e, assim, evitaria eventuais corridas de especuladores.
As mudanças teriam, portanto, um caráter preventivo. Sairia muito mais caro depois, imaginam o presidente e seus ministros, caso o Brasil ficasse vulnerável. Um dos problemas brasileiros, por exemplo, é não ter uma fronteira com os Estados Unidos, como o México.
Ao mesmo tempo, porém, uma queda de prestígio presidencial reduz a margem de negociação do governo com o Congresso na reforma da Constituição.

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