São Paulo, quinta-feira, 16 de março de 1995 |
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The time, the place, the girl
CARLOS HEITOR CONY RIO DE JANEIRO — Como todo mundo, tantas vi e de tantas tive notícia que cheguei à conclusão de que o mais prudente é não dar chute em despacho de macumba. Certa vez, Jorge Amado levou-me ao terreiro de Mãe Menininha do Gantois, eu fiz pé atrás, Jorge me tranquilizou: "Mal não pode fazer!"Admito com vergonha que já cultivava um embrião, um anteprojeto de superstição que mais cedo ou mais tarde me levaria a evitar escadas, gatos pretos, políticos vitoriosos e administradores em atividade. Fazem parte desse embrião duas ou três manias que estão dando certo. A mais gratuita delas, a mais inexplicável, é nunca estrear máquina de escrever sem antes apelar para algumas senhas. O macete não me fez rico, bonito e famoso, mas ainda me garante o pão triste e às vezes amargo que me sustenta. A mais constante dessas senhas está encimando a crônica. É o título de um filme da década de 40, musical da Warner com Denis Morgan e Jack Carson. Para falar a verdade, mal lembro o filme, outro dia encontrei-o numa locadora, não me interessei em levá-lo. Foi justamente nessa época que, cansado de filar máquinas alheias, comprei minha primeira Remington que conservo até hoje, metade por preguiça de vendê-la, metade por acreditar que é meu único e frágil talismã. Com ela, cometi a proeza de me transformar numa espécie de "serial killer" da nossa valente literatura nacional, escrevendo nove romances seguidos, evidentemente com a cumplicidade do Ênio Silveira, da Civilização Brasileira, que editou e reeditou todos eles. Até que atos e fatos do movimento militar de 64 tiveram o bom senso e o bom gosto de acabar com a farra. E por pouco não acabaram com o próprio Ênio e comigo. "The Time, the Place, the Girl" funcionou até agora, quando procuro forçar as portas da informática. No penoso esforço de me enturmar com os tempos, comprei e meti os peitos num PC 486 DLC 40 MB, mesmo sem ter a menor desconfiança do que possa ser isso. Ao testá-lo, a primeira crônica que nele escrevesse, por mais infame que habitualmente fosse, precisaria de um título. Aí está. Texto Anterior: A UNE não é mais aquela Próximo Texto: Reengenharia da fé Índice |
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