São Paulo, sábado, 18 de março de 1995
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Meia reforma

As modificações na Previdência Social propostas pelo governo corrigem algumas das distorções do sistema. Mas a emenda constitucional enviada anteontem ao Congresso ainda preserva privilégios do funcionalismo público.
Os requisitos para a obtenção da aposentadoria pelos servidores civis foram igualados aos do regime vigente para o setor privado, mas o valor dos pecúlios não foi limitado. Dependendo do que for fixado em lei complementar, os funcionários públicos poderão continuar a receber aposentadorias muito mais elevadas do que as dos trabalhadores do setor privado. Hoje, os benefícios para quem trabalhou em empresas particulares estão limitados a dez salários mínimos.
Para os militares, houve igualmente concessões. Inexiste o limite máximo e os critérios para a obtenção dos benefícios seguirão um regime próprio. É bem verdade que os salários dos servidores civis e militares são baixos. Mas não cabe à seguridade social resolver as várias distorções do setor público.
Preservada, portanto, parte da distorções do sistema atual, o custo da pretendida eliminação do déficit potencial da seguridade recai sobre os trabalhadores do setor privado.
A eliminação da aposentadoria por tempo de serviço parece necessária face ao aumento da expectativa de vida média no país. As pessoas podem hoje trabalhar mais anos do que em meados do século, quando o sistema foi instituído. O fim das distinções entre trabalhadores rurais e urbanos, porém, pode prejudicar os setores menos protegidos e organizados da sociedade.
As precárias condições de trabalho no campo tornam frequente —se não predominante— a informalidade. Sem registro e sem contribuir, os habitantes da zona rural ficam sujeitos a trabalhar toda a vida sem obter a aposentadoria. O pecúlio por idade cobre apenas uma mínima parte da expectativa média de vida na área rural e nas regiões mais pobres do país.
No Nordeste os homens vivem em média 61 anos e as mulheres 67. Nas piores situações, como a dos 1,5 milhão de habitantes da zona da mata de Pernambuco, os homens vivem em média só 47 anos. Claro que esses casos limites mostram antes a calamidade da miséria no país do que os desafios da Previdência. Mesmo assim, não deveriam ser ignorados por um sistema que se pretende geral.
Quanto à arrecadação, ainda que esteja prevista a possibilidade de instituir cobranças sobre o lucro, são mantidas as contribuições sobre a folha de pagamentos e o faturamento. Essas duas últimas estão entre as piores formas de arrecadar. Como entram diretamente nos custos de produção, ambas têm um impacto direto sobre os preços. A cobrança sobre a folha de pagamentos tem ainda a desvantagem de inibir o emprego e estimular a informalidade no mercado de trabalho. Obviamente, portanto, resta muito a fazer.

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