São Paulo, sexta-feira, 24 de março de 1995
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Falta consistência na suspeita de vazamento

FIDEO MIYA
DA REPORTAGEM LOCAL

As acusações disparadas pelo senador José Eduardo Dutra (PT-SE) contra os bancos BBA Creditanstalt, Pactual e ING Bank são no mínimo precipitadas e inconsistentes.
Ele apontou esses três bancos como suspeitos de terem sido os destinatários de supostos vazamentos de informações do Banco Central sobre a mudança na política cambial baixada no dia 6 de março passado.
São acusações gravíssimas, pois envolvem não só os banqueiros, mas funcionários e diretores do BC como suspeitos do crime de informação privilegiada.
O senador petista lançou suas acusações a partir da leitura dos saldos diários de dólares, junto ao BC, de 37 bancos credenciados a operar no chamado mercado de câmbio de taxas livres (onde são negociados os dólares de exportação, importação, entradas e saídas financeiras de capital estrangeiro).
O principal acusado foi o banco presidido por Fernão Bracher, amigo do presidente do BC, Pérsio Arida. O saldo em dólares do BBA junto ao BC subiu de US$ 56,239 milhões no dia 1º de março, para US$ 117,292 milhões e US$ 182,796 milhões nos dois dias seguintes, mostrando compras de, respectivamente, US$ 61,053 milhões e US$ 65,504 milhões.
Tais compras, feitas na semana entre os feriados do Carnaval —quando Arida visitou a fazenda da família Bracher no interior de São Paulo— e o dia 6 deste mês, quando foi anunciada a mudança na política cambial e o BBA vendeu US$ 178 milhões, foram a base das suspeitas do senador.
O BBA autorizou o BC a quebrar o sigilo bancário e divulgar dados sobre as suas operações de compra e venda de dólares, incluindo as do mercado futuro de dólar da BM&F (Bolsa de Mercadorias & de Futuros).
A nota oficial do BC não contradiz os dados apresentados pelo senador Dutra, mas refuta as conclusões de que teria havido vazamento de informações e acrescenta detalhes sobre as operações.
O primeiro detalhe é que, no dia 1º de março, o BBA vendeu US$ 22,862 milhões, reduzindo sua posição anterior de US$ 79,089 milhões para US$ 56,239 milhões. Quem tivesse informação privilegiada deveria ter comprado, e não vendido, nesse dia.
O segundo detalhe é que nos dois dias seguintes, segundo a nota do BC, quando comprou um total de US$ 126,557 milhões no mercado interbancário à vista ("spot"), o BBA vendeu US$ 83 milhões no mercado futuro de dólar da BM&F.
Trata-se, segundo o BC, de uma típica operação de arbitragem de taxas de juros. Ela consiste basicamente no seguinte: o banco credenciado a operar no câmbio compra dólar à vista e vende simultaneamente contratos futuros da moeda e de juros na BM&F.
O resultado final é que, nos três dias que antecederam a mudança da política cambial, computando-se todas as compras e vendas de dólares, a posição em moeda norte-americana do BBA aumentou US$ 20,596 milhões e não US$ 126,557 milhões.
O terceiro detalhe é que, segundo a nota do BC, o BBA tinha em sua carteira títulos do Tesouro Nacional, corrigidos pelo câmbio, com valor acima de US$ 200 milhões que venceram no dia 1º de março. Eles foram resgatados e o banco não recompôs a posição, o que seria lógico para quem tivesse informação privilegiada.

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