São Paulo, sexta-feira, 31 de março de 1995
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Wayne Shorter promete aventuras musicais

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Uma noite cheia de aventuras sonoras. A depender do saxofonista e compositor norte-americano Wayne Shorter, 61, isso é o que se pode esperar de sua participação no Heineken Concerts, em São Paulo (dia 6, no Palace) e Rio de Janeiro (dia 7, no Metropolitan).
Ao lado do trompetista norte-americano Wallace Roney, do baixista dinamarquês Mads Vinding e do trombonista Raul de Souza, Shorter será um dos convidados da noite ciceroneada pelo pianista Guilherme Vergueiro.
"Eu adiantaria apenas que estamos preparando uma surpresa muito agradável", disse o saxofonista e compositor à Folha, anteontem à noite, por telefone, de Los Angeles (oeste dos EUA).
Considerado um dos mais originais instrumentistas do jazz, Shorter acumula em seu currículo longas associações com o baterista Art Blakey e com o trompetista Miles Davis. Mais tarde, durante o período 1970-1985, liderou com o tecladista Joe Zawinul o mais famoso grupo de "jazz fusion", o Weather Report.
Antigo simpatizante da música brasileira (em 75, dividiu o álbum "Native Dancer" com Milton Nascimento e outros músicos brasileiros), Shorter é uma personalidade ímpar no meio musical.
Seu interesse pela literatura e pela cultura de outros países logo transparece em qualquer conversa. Bem a seu estilo, mencionou "Leaves of Grass" (Folhas de Relva), obra clássica do poeta norte-americano Walt Whitman, como "símbolo" do que pretende nessa parceria com Vergueiro.
No repertório dos shows, adianta, estarão composições de Cartola e Tom Jobim. "Vou tocá-las com o espírito da aventura, mas sem jamais afrontar a dignidade da cultura desses autores", explica.
Com essas palavras, Shorter quer dizer que tocar jazz ou mesmo alguma composição sua é algo totalmente descartado nas duas noites do Heineken Concerts.
"Será uma celebração à cultura e à música do Brasil. Estou sempre pronto a contribuir com essa música através de uma outra dimensão", diz o saxofonista, que já gravou com o percussionista Airto Moreira e com a banda Olodum, entre vários brasileiros.
Às vezes radical em seus pontos de vista, Shorter demonstra não ter papas na língua. "Não me envolvo com músicas que sugiram violência, ou que, apesar de serem belas, não tenham nada a ver com a vida de quem a compôs. Estas buscam apenas um efeito, pretendem somente o dinheiro."
Graças a essa atitude anticomercial, Shorter não encontra sentido, por exemplo, na continuidade do bem-sucedido projeto Tribute to Miles Davis —banda formada por ex-parceiros do trompetista, com a qual veio ao Brasil, em 1992, incluindo Wallace Roney.
Em fase de preparação de seu novo álbum (ainda sem gravadora definida), Shorter revela que terá a seu lado o baixo de Marcus Miller (ex-Miles Davis), que também assinará a produção.
"Nesse momento, estou escrevendo algumas peças para orquestra e outras para grupos de diferentes tamanhos", adianta.
Um dos pioneiros na fusão do jazz com o rock, Shorter não se mostra muito excitado pelas atuais tentativas de fundir o jazz com o rap e o hip-hop.
"Acho OK fazer essa fusão. Ninguém nunca saberia o que seria isso se alguém não tentasse descobrir como fazer essa mistura. O problema é encontrar as pessoas certas para descobrir como fundi-los com sinceridade e sentimentos verdadeiros", analisa.

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