São Paulo, quinta-feira, 6 de abril de 1995 |
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O Banco do Amor
MOACYR SCLIAR O homem sentado na mesa ao lado, no bar, não tinha lido a Folha, mas estava interessado na notícia:- Como é essa história do padre de Pirenópolis que tirou os bancos da praça para acabar com os namoros? Eu abri o jornal que estava sobre a mesa, li a nota. De fato, o religioso tinha removido os bancos. - Ele alegou que o lugar estava se tornando ponto de prostituição e de consumo de drogas - contei. Ele, porém, não estava interessado nestas explicações. Um sujeito já quarentão, de olhar melancólico e nariz vermelho -pelo jeito era um veterano frequentador de bares- queria mesmo era dizer o que pensava do assunto: - Com o devido respeito, eu acho que o padre fez mal. Não é só por causa do patrimônio público. Tem um outro detalhe. Chamou o garçom, pediu mais uma cerveja, continuou: - É o banco, sabe? O banco da praça. O amigo talvez não valorize muito isto, mas eu, que sou do interior, sei o quanto é importante o banco de praça. Na minha cidade havia um banco que todos os namorados procuravam. Diziam que dava sorte no casamento. Gerações e gerações de casaizinhos passaram por ali. Uns só conversavam, outros se abraçavam, havia alguns que iam mais longe, mas ninguém se importava, porque aquele era o banco do amor. O garçom trouxe a cerveja, ele reclamou: não estava tão gelada quanto gostaria. - Pelo menos a cerveja gelada tenho o direito - resmungou. E voltando-se para mim: - O que é mesmo que eu estava dizendo? Ah, sim, estava contando sobre o banco do amor, o banco que era depositário de toda a paixão da cidade. Aliás, o amigo já se deu conta de que a palavra banco tem dois sentidos? Para uns, é o lugar onde se guarda o dinheiro. Para outros, é um refúgio amoroso. Ficou um instante em silêncio e continuou: - Eu conheci a minha mulher na praça. Essa coisa de interior, você sabe: os rapazes e as moças vão à praça para se encontrar. E mal nos vimos, nos apaixonamos. Daí por diante, não saíamos do Banco do Amor. Ah, quantas confidências, quantas juras trocamos ali! Ah, como éramos felizes! Perguntei se o casamento tinha dado certo. Sacudiu a cabeça, desolado: - Não, não deu certo. Casamento é difícil, você sabe... Eu e minha mulher passamos o tempo todo brigando. É por isso que venho para o bar. Às vezes penso que se voltássemos para a nossa cidade e nos sentássemos de novo naquele banco... Uma idéia lhe ocorreu: - Escute: o que fizeram com os bancos da praça de Pirenópolis? - A notícia não diz. Mas parece que um dos bancos quebrou. Ou por acidente ou a golpes de marreta, não se sabe. Ele sorriu, amargo: - Viu? É o que eu lhe disse. Não dá para mexer com o Banco do Amor, meu amigo. Como qualquer banco, se você mexe muito, ele quebra. E ninguém arruma. No que eu tive de concordar. O amor é uma coisa muito frágil. Tão frágil quanto um velho e precário banco de praça. Texto Anterior: Situação se repete no PI Próximo Texto: A "cobrança por fora" dentro do SUS Índice |
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